Por Antônio Augusto de Queiroz (*)
São muitos os aspectos que os estrategistas de campanha terão que analisar e processar para ter um bom diagnóstico e projetar um bom prognóstico para seus candidatos. Dois aspectos precisam ser considerados: as manifestações de rua e as características do pleito.
A explosão de indignação de junho e julho, quando milhares de pessoas foram às ruas protestar, terá como conseqüência uma maior desilusão com a política, principalmente diante das respostas tímidas às demandas, e isso poderá levar a um índice recorde de abstenção, de votos brancos ou nulos.
As motivações dos protestos também merecem ser analisadas, para melhor compreender seus possíveis desdobramentos. Embora a agenda fosse difusa, percebe-se que o cidadão protestou em quatro das suas cinco dimensões e não o fez contra este ou aquele governante em particular.
A primeira dimensão foi a de eleitor, por não se sentir representado pelas instituições governamentais. Não há, de parte dos eleitos, respeito aos programas nem prestação de contas aos representados.
A segunda foi a de contribuinte, por entender que os recursos que paga de imposto não são bem aplicados. A percepção é de que as receitas tributárias são destinadas à construção de mega-estádios, são desviados ou vão para apoiar empresários como Eike Batista.
A terceira foi a de usuário de serviço público, pela notória má qualidade desses serviços, especialmente nas áreas de educação, saúde, transporte e segurança.
A quarta foi a de consumidor, pelo medo de retorno da inflação e também pela perda de renda decorrente do aumento das taxas de juros.
A quinta dimensão do cidadão, que é a do trabalhador enquanto classe, mesmo com o baixo crescimento da economia, não se fez presente nos protestos, entre outras razões, porque ainda está satisfeita com a geração de emprego e o aumento da renda, como comprovam as pesquisas do mundo do trabalho.
Se os trabalhadores e suas entidades tivessem ido às ruas, certamente as manifestações teriam tido um caráter mais estrutural. É que sempre que os trabalhadores protestam, de forma organizada e com caráter classista, há grandes transformações. Foi assim no combate à ditadura, na campanha da anistia e das eleições diretas, na constituinte e no impeachment de um presidente, entre outros.
Por exemplo: As manifestações não questionaram explicitamente os fundamentos da política econômica nem pediram a destituição dos governantes, o que levaria a mudanças estruturais. Com a classe trabalhadora nos protestos, esses pontos seriam os primeiros levantados.
O segundo aspecto, que exigirá muita imaginação dos marqueteiros e das direções partidárias, diz respeito às principais características do pleito de 2014, muito diferentes das de 2010, conforme tabela abaixo:
Eleição 2010 | Eleição 2014 |
Caráter plebiscitário | Sem caráter plebiscitário |
Polarizada entre PT e PSDB | Sem polarização |
Coincidência de agenda | Diferença de agenda |
Candidatos com perfil técnico ou gerencial | Candidatos com perfil político |
Ausência de terceira via | Terceira via consistente |
Denúncia como arma política da oposição | Debate programático |
Comparação do passado | Apontar para o futuro |
A disputa, a julgar pelo quadro acima, não terá caráter plebiscitário nem será entre ricos e pobres. Também não se dará entre os que estão com o PT e os que estão contra o partido. Ou entre os que defendem os trabalhadores e os que são contra. Ou ainda, entre quem defende a privatização e quem é contra. A disputa, tudo leva a crer, não será polarizada entre o PT e o PSDB. Desta vez, parece que existe uma terceira via consistente.
E o ambiente político, a despeito dos protestos e do baixo crescimento econômico, ainda é de continuidade, porém com exigência de correção de rumos, de estilo e postura dos governantes. Em conjunturas com essas características, a oposição tradicional tem pouco espaço.
Portanto, transmitir esperança e confiança ao eleitor pelos candidatos durante a campanha é fundamental para o desfecho da disputa. Os dois candidatos de oposição – Aécio Neves, do PSDB, e Eduardo Campos, do PSB – têm abordagens diferentes. O primeiro tem um discurso mais voltado para o ajuste das contas públicas e a defesa da economia de mercado, enquanto o segundo apoia as conquistas da redemocratização, da estabilidade econômica e os avanços sociais dos governos Lula e Dilma, prometendo fazer mais e melhor.
Nessa perspectiva, embora o PSDB – que nas últimas cinco eleições venceu duas em primeiro turno e disputou três em segundo turno – tenha uma grande base de apoio, num eventual segundo turno, terá grandes dificuldades por não estar em sintonia com o ambiente de continuidade. Já Eduardo Campos, cujo desafio é estar no segundo turno, se conseguir chegar à disputa final, será o candidato com maior potencial de ganhar da presidente Dilma.
Outra explicação para o cenário acima, caso a presidente Dilma não liquide a fatura em primeiro turno, é que no segundo turno, numa eventual disputa entre Aécio e Dilma, a tendência de Eduardo Campos é ficar neutro, marchar com a presidente ou seus votos migrarem majoritariamente para a candidata oficial. Já na hipótese de Dilma e Eduardo Campos, a tendência é que o apoio e os votos de Aécio Neves sejam canalizados para Eduardo Campos.
Sendo verdadeiras as premissas acima, a presidente Dilma está em melhor situação: pode ganhar em primeiro turno e só corre maior risco de perder num eventual segundo turno se a disputa for com Eduardo Campos, que contará com o apoio e os votos de Aécio. Já se a disputa se der entre Aécio e Dilma, ela é a franca favorita, já que, senão o apoio, certamente a esmagadora maioria dos votos de Eduardo Campos irão para ela. É aguardar para conferir.
(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap – Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.