BALANÇO DO CONGRESSO NACIONAL EM 2003
QUANTIDADE OU QUALIDADE?
Se existe alguém que não pode reclamar do trabalho do Congresso Nacional em 2003 é o Governo. Os deputados e senadores fizeram até sessão em final de semana e aprovaram praticamente todos os projetos de interesse do Executivo. Na Câmara, por exemplo, foram 342 sessões feitas durante o ano. Isso representa mais de uma sessão por dia, se desconsiderarmos os sábados e domingos. Os deputados aprovaram 56 medidas provisórias, 72 projetos de leis e 4 emendas constitucionais, entre elas as reformas Tributária e da Previdência Social. O Senado não ficou atrás e lançou até uma revista para mostrar o que foi feito em 2003. A lista das propostas aprovadas traz matérias polêmicas que mobilizaram a opinião pública como o Estatuto do Desarmamento, que torna o porte ilegal de armas inafiançável a adoção do regime disciplinar diferenciado para presos perigosos e os estatutos do Idoso e do Torcedor.
EXPULSÃO
A quantidade de matérias aprovadas superou as expectativas, mas a qualidade é questionada até mesmo por parlamentares do próprio governo. As divergências sobre a mudança nas regras de aposentadorias e no sistema de recolhimento de impostos, por exemplo, provocaram baixas na tropa governista. Quatro petistas foram expulsos do PT: Heloisa Helena, Babá , João Fontes e Luciana Genro. Parte da oposição ajudou o governo a aprovar as reformas e vários parlamentares votaram a favor, para respeitar o pedido dos governadores, para manter a coerência do discurso adotado na legislatura passada ou porque estavam de olho em cargos na Esplanada dos Ministérios. Sejam quais forem os motivos, a base aliada ao Palácio do Planalto terminou o ano com 376 deputados, de um total de 513.
REFORMAS
Quem permaneceu na oposição, no entanto, não poupa críticas ao conteúdo do que foi aprovado em 2003. Para a maioria, as reformas não passaram de remendos mal feitos. “Nós poderíamos ter tido uma reforma tributária que realmente viesse a diminuir esse enorme ônus que recai sobre o cidadão e não isso que fizeram. Ao contrário, aumentaram a carga do contribuinte”, reclamou a tucana Denise Frossard (PSDB-SP), que também não dispensa críticas às mudanças no sistema previdenciário. “Essa foi a reforma do caixa do funcionalismo público” diz a deputada, que prevê uma enxurrada de ações no Supremo Tribunal Federal em função das propostas aprovadas. Já o Advogado Geral da União, Álvaro Augusto Ribeiro Costa, se antecipou e entregou ao STF um memorial defendendo a legalidade da cobrança de contribuição dos inativos. Mas diante das insatisfações com a reforma previdenciária, o próprio governo aceitou votar uma emenda constitucional paralela, tentando dar novo formato ao texto original e acatando algumas das reivindicações do funcionalismo. Entre as melhorias contidas no texto da chamada PEC paralela estão a concessão de paridade aos atuais servidores, quando eles se aposentarem, desde que tenham completado 20 anos de serviço público, a permissão de alíquotas menores de contribuições ao INSS para trabalhadores sem vínculo empregatício e donas-de-casa e a definição de novos limites de isenção para efeito de cobrança da alíquota de 11% de contribuição de aposentados e pensionistas. A cobrança pode ser menor, ou inexistir, em caso de doenças incapacitantes, por exemplo. De acordo com a PEC paralela, o período de transição também sofre mudanças para quem começou a trabalhar muito cedo. Os homens que completarem 35 anos de serviço e as mulheres que completarem 30 anos de serviço, sendo 25 no funcionalismo, poderão ter o prazo de aposentadoria reduzido. A chamada PEC paralela já foi aprovada no Senado e neste início de 2004 será submetida à votação na Câmara dos Deputados, onde há sinais de resistência. Apesar de o governo ter manifestado empenho em aprovar a proposta alternativa, o deputado petista Paulo Bernardo (PT-PR) se faz de desentendido. “Precisamos saber o que é essa PEC paralela. Nós não temos conhecimento do texto dela, portanto, a primeira coisa é saber do que se trata. Eu não ouvi falar em nenhum compromisso do governo”. Paulo Bernardo disse também que respeita o trabalho feito pelos senadores, mas admite que ainda é cedo para falar em mudanças no texto da reforma da previdência. O senador Paulo Paim (PT-RS), no entanto, contesta as declarações de Paulo Bernardo. Segundo ele, a PEC Paralela é um avanço admitido e negociado no âmbito do governo. “A maioria das entidades de servidores públicos está a favor da aprovação rápida da PEC 77. Nós avançamos tudo que era possível. O papel do Senado está cumprido”, diz Paim. Já a reforma tributária vai continuar na agenda do Congresso. A unificação do ICMS e a desoneração da cesta básica, medicamentos e energia elétrica para a população de baixa renda ficaram para uma próxima etapa da reforma em 2005. De imediato, a CPMF foi prorrogada por mais quatro anos e, neste período, também haverá a Desvinculação de Receitas da União, a DRU.
DESARMAMENTO
Além das reformas constitucionais outras propostas polêmicas passaram pelas mãos dos deputados e senadores e até do Presidente da República, mas deixaram a desejar. É o caso do Estatuto do Desarmamento. As pesquisas mostram que a escalada da violência preocupa a população e que a maioria é favorável ao desarmamento, o que se questiona é a forma. “Não se pode tirar a arma de um cidadão de bem e entregá-la a um bandido,” diz o presidente do SINDIRECEITA, Reynaldo Puggi. Ele explica que não se trata de ser contra o desarmamento, mas de ser coerente. Puggi está preocupado, por exemplo, com a atuação dos Técnicos que trabalham na fronteira e muitas vezes têm que enfrentar o poder de fogo de contrabandistas e traficantes . “Não podemos deixar que eles enfrentem o crime organizado com pedras e estilingues”, afirma. O presidente do SINDIRECEITA espera uma atitude do Presidente da República no sentido de permitir que algumas categorias possam portar armas no exercício da profissão. O Estatuto do Desarmamento sancionado pelo presidente Lula prevê a realização de um referendo popular em outubro de 2005. O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) admite que o Estatuto não resolve o problema da violência. “Esse Estatuto não é uma panacéia. Não vai resolver por si só todos os males da criminalidade e proteger as pessoas, mas pode ajudar”, avalia o lider do PMDB no Senado.
CONVOCAÇÃO EXTRAORDINÁRIA
Apesar dos presidentes da Câmara, João Paulo Cunha e do Senado, José Sarney, considerarem satisfatório o trabalho do Congresso em 2003, os deputados e senadores não conseguiram escapar do trabalho no período de férias. Eles foram convocados para trabalhar no final de janeiro e no início de fevereiro. Entre as propostas incluídas na pauta da convocação extraordinária estão a chamada PEC Paralela da Previdência Social e o Plano Plurianual de Investimentos, uma previsão de gastos do governo de 2004 a 2007. Pelo trabalho extra, cada parlamentar recebe 3 vezes o salário normal que é de R$ 8 mil.Uma despesa adicional de cerca de R$ 50 milhões.