DIREITOS DA TERCEIRA IDADE
A terceira idade é analisada por ciências como a medicina, a antropologia, a sociologia e o direito, sendo neste último caso, fato social objeto de um conjunto especial de normas protetivas derivadas do preceito basilar da dignidade da pessoa humana.
Garantir a efetividade do merecido respeito à terceira idade resulta de uma simbiose entre sociedade, família e Estado, por meio da conscientização e do provimento de todos os meios para a garantia de cidadania aos mais velhos.
Pedra fundamental da sociedade, a família desempenha papel ímpar na vida daqueles que estão na terceira idade.
Embora a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Mundial de Saúde (OMS) conceituem o idoso como a pessoa maior de 65 anos, a Lei 8.842/94, que estabelece a política nacional do idoso, contempla como idosa a pessoa maior de 60 anos.
A proteção especial da terceira idade se justifica uma vez que, dadas suas peculiaridades na atual sociedade, o indivíduo idoso passa a ser potencial vítima de toda sorte de abusos, seja no âmbito familiar, seja no âmbito social, conforme dispõe a Magna Carta de 1988:
“Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.”
Posteriormente, a Lei 8.842/94 estabeleceu a Política Nacional do Idoso (PNI) com a finalidade de assegurar os direitos sociais deste, promovendo sua autonomia, integração e a efetiva participação na sociedade, atribuindo ao Ministério da Previdência e Assistência Social a coordenação da PNI. Nos arts. 3º e 4º da Lei 8.842/94, verificamos os seguintes princípios e diretrizes:
I- compete à sociedade, à família e ao Estado assegurar ao idoso os direitos da Cidadania;
II- o processo de envelhecimento diz respeito à sociedade em geral;
II - não discriminação do idoso;
IV- observação pelo poder público e pela sociedade das diferenças econômicas, sociais, regionais e sobretudo as contradições entre o meio rural e o urbano na aplicação da PNI;
V- viabilização de formas de participação e convívio do idoso que proporcionem sua integração às demais gerações;
VI- participação do idoso, por meio de suas organizações representativas, na elaboração de projetos e políticas;
VII- prioridade de atendimento no seio familiar, em detrimento ao atendimento asilar;
VII- descentralização político-administrativa;
IX- capacitação dos recursos humanos nas áreas de geriatria, gerontologia e na prestação de serviços;
X- divulgação dos trabalhos para os idosos em cada nível de governo;
XI- educação acerca dos aspectos biopsicossociais do envelhecimento;
XII- prioridade de atendimento aos idosos em órgãos públicos e privados;
XIII- incentivo à pesquisa sobre o envelhecimento.
Conforme disposto na Lei 8.842/94, os órgãos e entidades públicas, na seara da justiça, têm o dever de promover e defender os direitos da pessoa idosa, bem como zelar pela aplicação das normas sobre o idoso; o art. 10, § 3º estabelece ainda que todo cidadão tem o dever de denunciar à autoridade competente qualquer forma de negligência ou desrespeito ao idoso.
Em conseqüência da Política Nacional do Idoso, foi sancionada a Lei 10.741/03, denominada Estatuto do Idoso, estipulando prioridades como saúde, habitação, transporte e até mesmo definindo crimes:
“Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade:
Pena reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
§ 1º Na mesma pena incorre quem desdenhar, humilhar, menosprezar ou discriminar pessoa idosa, por qualquer motivo;
§ 2º A pena será aumentada de 1/3 (um terço) se a vítima se encontrar sob os cuidados ou responsabilidade do agente.
Art. 97. Deixar de prestar assistência ao idoso, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, em situação de iminente perigo, ou recusar, retardar ou dificultar sua assistência à saúde, sem justa causa, ou não pedir, nesses casos, o socorro de autoridade pública:
Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.
Art. 98. Abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado:
Pena detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos e multa.
Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado:
Pena detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa.
§ 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
§ 2º Se resulta a morte:
Pena reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.
Art. 100. Constitui crime punível com reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa:
I obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público por motivo de idade;
II negar a alguém, por motivo de idade, emprego ou trabalho;
III recusar, retardar ou dificultar atendimento ou deixar de prestar assistência à saúde, sem justa causa, à pessoa idosa;
IV deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida na ação civil a que alude esta Lei;
V recusar, retardar ou omitir dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil objeto desta Lei, quando requisitados pelo Ministério Público.
Art. 101. Deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida nas ações em que for parte ou interveniente o idoso:
Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
Art. 102. Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da sua finalidade:
Pena reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa.
Art. 103. Negar o acolhimento ou a permanência do idoso, como abrigado, por recusa deste em outorgar procuração à entidade de atendimento:
Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
Art. 104. Reter o cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios, proventos ou pensão do idoso, bem como qualquer outro documento com objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida:
Pena detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa.
Art. 105. Exibir ou veicular, por qualquer meio de comunicação, informações ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa do idoso:
Pena detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.
Art. 106. Induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente:
Pena reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.
Art. 107. Coagir, de qualquer modo, o idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração:
Pena reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
Art. 108. Lavrar ato notarial que envolva pessoa idosa sem discernimento de seus atos, sem a devida representação legal:
Pena reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos”.
Não obstante a previsão dos tipos penais acima, o Código Penal Brasileiro estabelece que se o crime é praticado contra pessoa idosa, esse fato se constitui, conforme o caso, em agravante genérica do crime ou em causa de aumento de pena.
Dentre as prioridades previstas nos Estatuto do Idoso, cabe observar a facilitação do acesso à justiça, previsto no art. 71, por meio da prioridade na tramitação de processos em que a pessoa maior de sessenta anos seja parte ou interveniente, abreviando assim a espera pela prestação jurisdicional.
Infrações às normas protetivas do idoso devem ser comunicadas ao Ministério Público para a instauração de procedimento visando aplicar penalidade administrativa aos infratores, ou se o fato constituir crime, o idoso vítima deverá formular representação perante autoridade policial.
Não se pode olvidar que, nos termos do art. 217 “d” e “e” da Lei 8.112/90, os maiores de sessenta anos que vivam sob a dependência econômica de servidor público são beneficiários de pensão vitalícia em caso de morte do servidor, o mesmo ocorre em relação aos pais do servidor. A dependência deverá constar nos registros funcionais por meio de manifestação expressa do servidor, evitando assim a eventual propositura de Ação Judicial objetivando o reconhecimento da dependência econômica em relação ao falecido servidor.
Conclui-se que as normas de proteção ao idoso objetivam compelir tanto a sociedade e a família quanto o Poder Público para a garantia de uma vida digna à terceira idade, estabelecendo o direito à saúde, ao lazer, ao trabalho, à liberdade e à interação do idoso na comunidade, reconhecendo e valorizando a experiência e a sabedoria daqueles que construíram a história do Brasil.
Maria Carolina Leonor Masini dos Santos
Advogada do Sindireceita
Núcleo de São Paulo