Crise internacional embaralha cenário para aprovação da Reforma Tributária
Mais uma vez o Governo Federal anuncia, no retorno dos trabalhos do Legislativo, que a reforma tributária está entre suas prioridades. Mas a aprovação da proposta de Emenda Constitucional 233/08, que já enfrentava problemas políticos, agora poderá esbarrar nos efeitos da crise econômica internacional. No início deste mês, a oposição disse que está disposta a impedir a votação da matéria na retomada aos trabalhos no Congresso Nacional. A reação veio do líder do governo, deputado Henrique Fontana (PT-RS), que garante ser a reforma tributária uma das prioridades do Executivo para este ano. O presidente da Câmara Michel Temer também demostrou disposição de colocá-la na pauta de votação em breve.
Em dezembro, o governo tentou votar o texto, mas a oposição obstruiu os trabalhos. Para solucionar o impasse, na época, foi fechado o acordo que liberou as votações e transferiu a análise da reforma para março deste ano. Na Comissão, os partidos de oposição DEM, PSDB, Psol e PPS votaram contra o texto-base da reforma. Para ser aprovado, o relatório do deputado federal Sandro Mabel (PR/GO) necessita de 308 dos 513 deputados no plenário da Câmara. A proposta precisa ser encaminhada ao plenário, onde tem que ser votada em dois turnos, para,em seguida, ser enviada ao Senado. Ex-governador Germano Rigotto defende mais empenho político para votação da proposta
O texto da proposta foi aprovado na Comissão Especial da Reforma Tributária e tem como objetivos simplificar o sistema tributário brasileiro, que é um dos mais complexos do mundo, e acabar com a guerra fiscal entre os estados. Ao racionalizar a cobrança de tributos, a reforma poderá contribuir, a médio e a longo prazo, com a redução da carga tributária que hoje é de aproximadamente 36% do PIB. Um dos principais pontos da PEC é a criação do Imposto sobre Valor Adicionado Federal (IVA-F) a partir da fusão do PIS/Pasep, da Cofins e da contribuição para o salário-educação. Se a arrecadação do novo tributo superar a soma dos anteriores, o governo será obrigado a reduzir alíquotas.
Além das articulações no Congresso Nacional, o governo também tem trabalhado para buscar apoio para a proposta junto aos setores organizados da sociedade. Uma das iniciativas foi a realização de vários eventos no ano passado, coordenados pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República (CDES/PR). O ex-governador do Rio Grande do Sul Germano Rigotto foi um dos coordenadores dos debates que ocorreram em vários estados brasileiros em busca de uma proposta de consenso. Segundo ele, o conselho apresentou várias sugestões ao governo, e assim o trabalho dará ênfase à tramitação da matéria no Congresso Nacional. Nesta entrevista, o ex-governador fala sobre as dificuldades enfrentadas para aprovar uma proposta de reforma no País e critica a falta de decisão política que impediu avanços na administração tributária brasileira.
TRIBUTU$ - O senhor acredita que será possível aprovar a reforma tributária ainda este ano?
Germano Rigotto - Para que a reforma tributária fosse aprovada ainda em 2009, precisaríamos contar com mais decisão política dos poderes Executivo e Legislativo. O ano de 2007, tido como ideal, foi perdido. Em 2008, por ser um ano eleitoral, a reforma foi sendo adiada mês a mês. Quanto mais nos aproximarmos de 2010, mais o tema se misturará com a eleição presidencial e menor será a chance de a reforma ser aprovada. Sinceramente, não estou vendo vontade política para que se aprove.
TRIBUTU$ - O que é necessário para aprovar a proposta?
Germano Rigotto - Vontade política dos poderes. Ao longo desses anos, isso não aconteceu.
TRIBUTU$ - Qual a avaliação que o senhor faz da proposta apresentada pelo governo e da aprovada na Comissão Especial da Câmara?
Germano Rigotto - A proposta, na verdade, tem avanços, mas há ainda modificações a serem feitas. Ela começa com um correto processo de racionalização do sistema tributário nacional, mas existem questões, como o Fundo de Equalização, que podem enfrentar resistência por parte dos estados, pois não está claro o seu funcionamento, assim como o Fundo de Desenvolvimento Regional. Deve haver avanços em questões como essas para que a proposta seja aprovada.
TRIBUTU$ - Quais os principais problemas da proposta e onde seria possível evoluir?
Germano Rigotto - Além dos problemas com o Fundo de Equalização, acredito que poderia haver também uma discussão sobre regulação das mudanças que ocorrerão no capítulo tributário da Constituição em função da reforma. Seria importante que os parlamentares fizessem simulações, pois existem muitas dúvidas de como seriam as mudanças ocasionadas pela reforma. Tenho certeza de que isso ajudaria no avanço da proposta.
TRIBUTU$ - Essa reforma terá condições de resolver os problemas do sistema tributário nacional?
Germano Rigotto - Ela começa a melhorar o sistema tributário brasileiro. Sem dúvida, ela não resolve todos os problemas, mas aperfeiçoa o nosso sistema. É um avanço. “Para que a reforma tributária fosse aprovada ainda em 2009, precisaríamos contar com mais decisão política dos poderes Executivo e Legislativo.”
TRIBUTU$ - Que medidas poderiam ser adotadas para reduzir a carga tributária?
Germano Rigotto - É necessário um sistema mais racional, eficiente e com melhor distribuição da carga tributária. Quando se busca a racionalização, é para facilitar a fiscalização e a arrecadação, diminuindo a evasão fiscal, por meio da informalidade, da sonegação e da elisão fiscal. Com a ampliação da base tributária, poderíamos conseguir cargas setoriais.
TRIBUTU$ - O governo criou a Receita Federal do Brasil como forma de aumentar a eficiência da administração tributária brasileira. O senhor acredita que esse é o caminho? Em sua avaliação, houve alguma evolução no sistema tributário brasileiro após a criação da chamada Super-Receita?
Germano Rigotto - Eu acho que a Super-Receita veio para exatamente facilitar o cruzamento de informações, atacar o problema da evasão fiscal com mais força e fortalecer a Receita. É um processo, entretanto não ocorre com a rapidez que se gostaria. Além disso, a Super-Receita, por si só, não significa uma evolução no sistema tributário nacional, significa, sim, um avanço nos controles.
TRIBUTU$ - Além da carga tributária elevada, os setores produtivos também reclamam muito da burocracia e das elevadas exigências para que uma empresa cumpra com suas obrigações. O senhor vê alguma melhora nesse aspecto ou nenhuma mudança significativa foi tomada para tornar menos complexo o sistema tributário nacional?
Germano Rigotto - Nos últimos anos, o Super Simples significou um avanço na desburocratização e na desoneração de micro e pequenas empresas, além de uma busca pela diminuição da evasão fiscal. Foi uma mudança que veio para melhorar.
TRIBUTU$ - Que medidas tributárias deveriam ser tomadas neste momento de crise econômica?
Germano Rigotto - De alguma forma, existe espaço para fazer com que os setores mais impactados pela crise possam ter uma atenção especial do Governo Federal. A agilização na devolução dos créditos de exportação é um avanço. Também seria positivo se o governo permitisse a compensação de outros tributos federais. Esses créditos poderiam amenizar a situação de alguns setores. Acredito ser necessária uma análise caso a caso, para ver os setores mais impactados e quais as alternativas viáveis para socorrê-los.
TRIBUTU$ - Em sua opinião o Brasil tem condições de sair desta crise rapidamente e qual a importância que a reforma tributária assume nesse contexto?
Germano Rigotto - A reforma tributária não será, por si só, uma solução para a crise, por conta da longa etapa de transição necessária para a sua implementação. Porém, ela seria, sim, uma sinalização altamente positiva para dentro e para fora do país.
TRIBUTU$ - Qual tem sido o papel do Conselho de Desenvolvimento Econômico nos debates da reforma tributária e qual deve ser o papel deste Conselho em um momento de crise econômica como este?
Germano Rigotto - O Conselho debateu, acerca da proposta do governo sugeriu e opinou. Muitas sugestões foram aceitas e outras não. Agora, continuamos com o acompanhamento da reforma no Congresso. Sou o coordenador do grupo que acompanha e discute a tramitação no Legislativo. Com relação à crise, temos um grupo de acompanhamento que analisa cada medida que o Governo Federal está adotando e seus efeitos, além de sugerir novas. Esse será um trabalho que durará enquanto durar a crise, na busca de caminhos para que se amenize os efeitos da turbulência internacional.
TRIBUTU$ - Que proposta de reforma tributária o conselho defende?
Germano Rigotto - Uma reforma tributária que racionalize, simplifique e desonere a produção, garantindo ainda mais justiça fiscal.
TRIBUTU$ - Como o senhor avalia o trabalho realizado pelo grupo que trata da reforma tributária no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social?
Fotos: assessoria de imprensa de Germano Rigotto
Germano Rigotto - Trabalhamos muito, tivemos muitas reuniões e conseguimos colaborar com muitas sugestões aceitas pelo governo. O nosso trabalho continua até que seja aprovada a reforma.
TRIBUTU$ - Foi possível retirar algum consenso de tudo que foi apresentado ao longo do último ano?
Germano Rigotto - Com certeza. Dentro do CDES, há uma certeza de que se deve reduzir o número de contribuições sociais e operar mudanças no ICMS, que passaria a ter uma única legislação, com um menor número de alíquotas e a migração da cobrança da origem para o destino. São questões que unem o Conselho. $