O pré-sal é nosso!
Brasil e os Estados Unidos estariam alinhando interesses para firmar acordos de exportação de petróleo e derivados brasileiros para o território americano. As informações já circulam informalmente, mas a imprensa internacional divulga que a intenção do governo de Barack Obama é pôr fim à dependência energética da Venezuela.
Para Paulo César Ribeiro Lima, consultor Legislativo da Câmara dos Deputados e autor do estudo “Um novo marco legal para pesquisa e lavra das jazidas brasileiras de petróleo e gás natural”, o Brasil passará a exportar petróleo a partir de 2017. Com a descoberta dos campos de pré-sal na Bacia de Santos, Lima estima que o potencial brasileiro de produção de barris quadruplicará. “Hoje, as reservas brasileiras estão em torno de 14 bilhões de barris. A expectativa é que só nessa área da Bacia de Santos sejam produzidos mais de 50 bilhões de barris”, destaca.
O consultor defende que o petróleo seja produzido e refinado no Brasil. “Seria interessante que o petróleo fosse produzido e que fossem construídas muitas refinarias, para gerar emprego e renda. Para isso, o modelo tributário brasileiro também deve ser rediscutido, porque há fortes tributações nos derivados de petróleo consumidos internamente, como o ICMS da gasolina que é de 25%, ou seja, muito alto”.
TRIBUTU$ - Por que esse petróleo é chamado de pré-sal?
Paulo César Lima - Esse óleo está acumulado abaixo de uma camada de sal. Há 120 milhões de anos, tínhamos um lago entre a América e a África. Era pequeno, fino e corria ao longo da costa brasileira e da costa africana. Esse ambiente lacustre recebia muita matéria orgânica dos rios, o que propiciou a geração de muitos fitoplanquitos e risoplanquitos, microorganismos que ficam na superfície da água. Ao longo de milhões de anos, essa matéria orgânica foi sendo depositada. Com a separação dos continentes, houve a entrada de água do mar e, com o clima quente, o sal foi sendo depositado por milhões de anos. Com a separação das placas tectônicas da América e da África, houve um aumento das pressões e da temperatura, o que provocou a ruptura da camada de sal e da matéria orgânica. No primeiro estágio, essa matéria orgânica produz querogênio e, ao longo do tempo, as moléculas desse betume são quebradas pelo processo de craqueamento, o que produz o petróleo. Para chegar ao prospecto do pré-sal da área de Tupi na Bacia de Santos, por exemplo, é preciso percorrer dois mil metros de lamina d’água, três mil metros de sedimento, mais dois mil metros de camada de sal para depois chegar ao reservatório.
TRIBUTU$ - E qual o impacto e o potencial das reservas no Brasil?
Paulo César Lima - A Petrobrás já divulgou volumes recuperáveis de petróleo nos blocos licitados na Bacia de Santos, estimados em 5 a 8 bilhões de barris no campo de Tupi, e de 3 a 4 bilhões de barris no prospecto de Iara. Então, estamos falando num potencial de 12 bilhões de barris apenas nesse bloco, chamado de BMS 11. Como são muitos outros blocos com as mesmas características de Tupi e Iara, a expectativa é que só nessa área da Bacia de Santos sejam produzidos mais de 50 bilhões de barris, o que corresponde a quatro vezes as reservas brasileiras. Ainda temos de lembrar que a Petrobrás já perfurou três poços no pré-sal do Espírito Santo, todos com altíssima produtividade. Devemos lembrar também que esse poço é vertical. Um poço de produção com maior inclinação e poços horizontais podem aumentar ainda mais a produção no reservatório nesse carbonato do pré-sal. Já na Bacia de Campos, chamamos o óleo de pós-sal, porque está acima da camada de sal. Existe, porém, uma grande diferença na qualidade dos óleos. O óleo que migrou para cima da camada do sal ficou exposto a temperaturas mais baixas e houve uma biodegradação, por isso o óleo da Bacia de Campos é viscoso, pesado.
TRIBUTU$ - E quanto ao debate em relação à exportação ou à manutenção das reservas, o que o senhor pensa sobre isso?
Paulo César Lima - O que tenho defendido é que o petróleo seja produzido e refinado no Brasil. Acredito que o modelo dos outros países, de exportação do petróleo bruto, petróleo cru, é muito bom para países menores. Por exemplo, no modelo norueguês, o estado se apropria de grande parte da receita do petróleo que é exportado. Mas a Noruega é um país com 6 milhões de habitantes. Lá não existe a demanda e a carência da sociedade brasileira. Seria interessante que o petróleo fosse produzido e que fossem construídas muitas refinarias, para gerar emprego e renda. Para isso, o modelo tributário brasileiro também deve ser rediscutido, porque há fortes tributações nos derivados de petróleo consumidos internamente, como o ICMS da gasolina que é de 25% , ou seja, muito alto.
TRIBUTU$ - O petróleo do pré-sal é uma questão de Estado?
Paulo César Lima - É sim. A nossa luta ao longo do tempo foi pela auto-suficiência, e essa fase foi superada. A perspectiva em 2017 é que estejamos exportando petróleo.
TRIBUTU$ - O senhor acredita que o debate político do pré-sal tem superado o debate técnico?
Entrevista original do programa “Receita de Cidadania”
Paulo César Lima - Acredito que não. Como é uma questão de Estado, o debate tem de ser político, mas alicerçado numa base técnica.
TRIBUTU$ - A ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) declarou que os contratos assinados serão preservados. Isso acontecerá mesmo que o marco seja modificado?
Paulo César Lima - Os contratos serão respeitados. Mas, mesmo respeitando os contratos, existe a questão da unitização do campo e, nesse caso, não há previsão legal. Além do petróleo, ela só prevê a unitização de campo que se estenda de um bloco licitado para outro licitado. Então quem irá defender os interesses da União num processo de individualização? Ou seja, quando houver o rateamento da receita líquida, decorrente da produção daquele campo, ela será dividida na proporção do óleo acumulado em cada uma das áreas. Essa discussão é técnica entre engenheiros e geólogos para celebrar o acordo para individualização da produção. Se esses profissionais não chegarem a um consenso, quem irá determinar, por meio de um laudo arbitral, o que cabe a cada parte, será o órgão regulador, a ANP. É fundamental, no processo de unitização, que a União tenha uma representação técnica, feita por uma empresa pública que represente os interesses da União.
Eu também defendo que no futuro, nas áreas do pré-sal, exista a possibilidade da celebração de contrato de partilha da produção, uma vez que os grandes países produtores de petróleo utilizam-no. Nesse contrato, a União recebe uma parte do óleo que chamamos de óleo lucro. Todo óleo lucro daquele empreendimento é repartido entre o país e o consórcio que venceu a licitação para a partilha de produção. Esse é um modelo de partilha que eu defendo para as futuras licitações dos blocos do pré-sal, porque, com o modelo de licitação, é muito difícil fazermos uma política industrial com o petróleo do pré-sal. No modelo de concessão, o óleo produzido é do concessionário. A única restrição para a utilização desse óleo é o abastecimento interno de combustíveis. Se o Brasil estiver abastecido de derivados de petróleo, a concessionária pode exportar o óleo. A União não terá nenhuma ingerência, porque a propriedade do petróleo é da empresa. Já na partilha de produção, isso ocorreria parcialmente. $