Frente parlamentar vai avaliar propostas para modernização da aduana brasileira
A corrente de comércio brasileira registrou em 2008 um crescimento de 30,4% em comparação ao ano anterior. A soma dos valores exportados e importados chegou a US$ 371,149 bilhões, resultado de uma média diária de operações de US$ 1,467 bilhão. Todo esse fluxo de mercadorias importadas e exportadas passou por uma das mais de 70 unidades aduaneiras da Receita Federal, que é o órgão público responsável por fiscalizar e arrecadar os tributos incidentes sobre o comércio exterior, exercer o controle aduaneiro e exigir o cumprimento da legislação. Mas, de acordo com o último Relatório de Auditoria Anual de Contas da Receita Federal do Brasil, o controle dessas operações no País cobre apenas parte desse movimento de produtos. No período avaliado pelo relatório, que foi de abril de 2007 a maio de 2008, foram realizadas 27.589 ações de auditoria e fiscalização tributária e aduaneira no País.
Para o presidente do Sindireceita, Paulo Antenor de Oliveira, a comparação desses dados aponta para graves problemas no controle de mercadorias que entram e saem pelos portos, aeroportos e diversos pontos de fronteira em todo o território nacional. Segundo Antenor, a Receita Federal do Brasil precisa rever procedimentos e ampliar sua presença e atuação no controle aduaneiro.
Com esse propósito, foi criada a Frente Parlamentar pela Modernização da Aduana Brasileira que avaliará propostas que visam agilizar procedimentos aduaneiros e apresentará sugestões para alteração de leis com vistas à ampliação de segurança das operações aduaneiras, à redução de custos de armazenagem e ainda vai propor melhorias no atendimento logístico, nas condições de trabalho dos servidores e de infraestrutura. A frente é uma iniciativa do Sindireceita, em conjunto com os deputados federais Fernando Melo (PT-AC), Vignatti (PT-SC), Osmar Serraglio (PMDB-PR), o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) e já conta com a adesão de mais de 200 parlamentares.
A instalação da Frente foi realizada no dia 12 de agosto, no Plenário 14 da Câmara dos Deputados. Na ocasião, foram eleitos os membros da mesa diretora que ficou composta da seguinte forma: presidente – deputado federal Fernando Melo (PT/AC), 1º vice-presidente – senador Heráclito Fortes (DEM/PI), 3º vice-presidente – deputado federal Vilson Covatti (PP/RS), secretário-geral – deputado federal Osmar Serraglio (PMDB/PR) e coordenador nacional – deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB/PR).
Na opinião de Paulo Antenor, por meio da Frente Parlamentar será possível promover uma ampla avaliação da Aduana brasileira, que sofre com a falta de estrutura e de investimentos. “A Frente terá um papel fundamental ao propor uma discussão sobre a necessidade de se modernizar a Aduana nacional, que está entre as mais morosas do mundo”, destaca. “A Frente terá um papel fundamental ao propor uma discussão sobre a necessidade de se modernizar a aduana nacional, que está entre as mais morosas do mundo”
Paulo Antenor
De acordo com o Fórum Econômico Mundial o Brasil ocupa a 80º posição no ranking de abertura ao comércio exterior, atrás da China, Índia e México. A lista relaciona 118 nações e utiliza critérios como políticas e serviços que facilitam o livre trânsito de bens pelas fronteiras e até o destino dos produtos, bem como analisa as condições de segurança e controle do fluxo de comércio. O relatório anual produzido pelo Banco Mundial, por meio da sua unidade para o setor privado, a IFC (Internacional Finance Corporation), também aponta que o Brasil está entre as nações com elevados custos para exportação. Os custos no Brasil chegam a US$ 1.240 por contêiner, enquanto na China o custo é de apenas US$ 460 por unidade, e são superiores à média registrada nos países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que é de US$ 1.069 por contêiner. “Infelizmente, o Brasil é um dos países onde o tempo para se concretizar o comercial internacional está entre os mais altos do mundo. Os nossos custos também estão entre os mais elevados; se comparados com a China, são três vezes maior. O Brasil deve modernizar o seu comércio internacional, porque não há alternativa, estamos em um mundo globalizado onde a necessidade de rapidez e de custo baixo é cada vez mais premente”, afirmou Antenor durante o lançamento da frente.
A diretora Parlamentar do Sindireceita, Sílvia Felismino, destacou a relevância do debate para todo o País. “É com muita honra que o Sindireceita dá o pontapé em mais um tema. Quando lançamos a campanha de combate à pirataria, a Receita Federal acreditava que a pirataria não era um problema da Casa. Depois, a Receita verificou, por meio do trabalho do Sindireceita, que era necessário um combate eficaz da pirataria. Agora estamos lançando o debate da aduana”, disse.
O presidente da Frente, deputado federal Fernando Melo (PT/AC), acredita que a iniciativa será muito importante para toda a sociedade brasileira. “Se modernizarmos a Aduana brasileira, os empresários que importam e que exportam terão melhores condições de trabalho. Os custos dessas empresas também serão reduzidos e, na ponta, o consumidor poderá ganhar”, opinou. Melo destacou que a frente se reveste de importância ainda maior em um momento de crise na economia mundial. “Todos podemos apontar alternativas para tornar mais eficiente, mais barato e mais seguro o acompanhamento das mercadorias que entram e que saem em todo o território nacional”, disse.
O deputado federal Cláudio Vignatti (PT-SC), presidente da Comissão de Finanças e Tributação e 2º vice-presidente da Frente, acrescenta que as discussões poderão contribuir para simplificar e desburocratizar procedimentos. “Temos que vencer algumas questões para melhorar a relação comercial do Brasil. Uma delas é o nosso sistema de defesa da concorrência, o Cade. Outra questão que o mundo reclama do Brasil é o sistema tributário, que está na pauta da Câmara dos Deputados e que, apesar das divergências, é uma proposta de simplificação tributária nacional. Portanto, as aduanas precisam, de fato, acabar com a burocracia que, muitas vezes, atrasa as exportações”. “Todos podemos apontar alternativas para tornar mais eficiente, mais barato e mais seguro o acompanhamento das mercadorias que entram e que saem em todo o território nacional”
disse Fernando Mello.
Para o 3º vice-presidente, deputado federal Vilson Covatti (PP-RS), a frente visa aproximar o legislador com os problemas vividos na base das aduanas. Na opinião de Covatti, o trabalho da frente será intenso e em parceria com as comissões permanentes do Congresso Nacional. “Essa frente já nasce com um prazo de conclusão dos trabalhos. Teremos que alcançar os resultados antes do processo eleitoral, pois é preciso que os candidatos à Presidência da República se comprometam com a concretização da modernização da Aduana brasileira”.
Insegurança
Outro ponto que receberá atenção especial dos parlamentares e autoridades que participarão dos debates é a necessidade de ampliação da estrutura, de treinamentos e da presença de órgãos federais em regiões de fronteira. Paulo Antenor afirma que, em vários pontos do País, o Judiciário tem intimado a Receita Federal a ampliar a fiscalização e o controle aduaneiro. Em uma das ações, a 1ª Vara da Justiça Federal de Umuarama/PR, condenou a União Federal a destinar mais servidores para a Inspetoria da Receita Federal em Guaíra/PR, que pela precariedade do órgão, estaria contribuindo para o aumento do contrabando, do descaminho e para o crescimento da criminalidade na região, localizada na divisa entre o Brasil e o Paraguai.
Já no estado de Roraima, o Ministério Público Federal encaminhou uma recomendação à Casa Civil da Presidência da República para que fosse suspensa a liberação provisória da ponte sobre o rio Tacutu, que liga o Brasil à Guiana, com o objetivo de garantir a segurança pública e diminuir riscos à população. A recomendação é que a ponte seja liberada, mesmo que provisoriamente, apenas quando houver, no mínimo, dois auditores-fiscais, quatro Analistas-Tributários da Receita Federal e seis agentes da Polícia Federal. O MPF/RR considera que a falta de estrutura e de pessoal, tanto da Polícia Federal quanto da Receita Federal, impede o controle efetivo dos produtos que ingressam no Brasil e, desta forma, expõe em risco a segurança e a saúde pública dos brasileiros. O presidente do Sindireceita, Paulo Antenor, destaca que a situação se repete em várias unidades aduaneiras. “É comum a Aduana encerrar as atividades na fronteira às 18h00. Servidores fecham o posto e vão embora porque não há segurança e nem estrutura física para permitir a fiscalização à noite”, disse.
Um outro exemplo de insegurança nas unidades aduaneiras foi o ocidente envolvendo um Analista-Tributário, durante procedimento de trânsito aduaneiro, ocorrido em 16 de maio de 2008, na Área de Controle Integrado (ACI), em Ciudad Del Este, no lado paraguaio da Ponte Internacional da Amizade. A explosão de um contêiner carregado com 22 mil quilos de isqueiros feriu três pessoas. O Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil Celso Martines, de Foz do Iguaçu/PR, foi o mais atingido pelas chamas e ficou em estado gravíssimo de saúde. Martines teve 40% do corpo queimado. As queimaduras de 2º e 3º graus atingiram todo o seu corpo, principalmente os braços, o tórax e a cabeça.
Frente Parlamentar do RS
A falta de uniformidade e padronização dos procedimentos aduaneiros, de integração da legislação, a inexistência de sistemas de informação modernos, a carência de pessoal e a total ausência de política de pessoal foram alguns dos problemas relacionados à Aduana brasileira citados durante audiência pública, realizada no dia 25 de junho, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Deputados estaduais lançaram a Frente Parlamentar pela Modernização da Aduana Brasileira do Estado do Rio Grande do Sul nos mesmos moldes da Frente nacional. A coordenação dos trabalhos no RS ficará sob a responsabilidade do deputado Frederico Antunes (PP).
A audiência pública contou com a participação de diversas autoridades dos órgãos que atuam nas fronteiras, portos e aeroportos. Entre eles, representantes da Receita Federal do Brasil, Anvisa, Infraero, Vigilância Agropecuária, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) e representantes de entidades ligadas à Aduana como a Associação Brasileira de Transportes Internacionais (ABTI) e a Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NCT Logística).
De acordo com o coordenador de estudos técnicos da Frente e delegado sindical do Sindireceita em Uruguaiana/RS, Analista-Tributário Mauro Müller, a falta de modernização da Aduana brasileira afeta diretamente a competitividade das empresas e contribui para um “custo Brasil” alto, o que atrapalha o desenvolvimento econômico do País.
Entre os gargalos que afetam atualmente a Aduana brasileira, Mauro Müller citou as diferentes formas de realizar os mesmos procedimentos nas unidades da Receita Federal de todo o País. “Cada Região Fiscal e localidade possui uma forma de executar os procedimentos. Trata-se de uma decisão de cunho meramente administrativa e cada unidade decide como vai fazer. No porto seco de Uruguaiana/RS, por exemplo, os Analistas-Tributários fazem a verificação física das mercadorias e o relatório dessa verificação. Mas, na maioria das unidades da Receita, essa atividade é realizada pelos auditores-fiscais da Receita Federal do Brasil. Como não delegam essa atividade ao Analista-Tributário, que inclusive tem competência legal para isso, por falta de pessoal, muitas vezes, atrasa-se todo um processo, toda uma cadeia produtiva”, destacou.
A falta de integração da legislação aduaneira, na opinião de Mauro Müller, é também um fator agravante e está em descompasso com a realidade. “Há uma diversidade enorme de legislação, de atos, de instruções, de detalhamentos, uma legislação esparsa que, algumas vezes, não atende à realidade”.
Outro ponto crítico e contraditório, na análise do Analista-Tributário, é a falta de sistemas de informação modernos e a falta de integração entre os mesmos. “A Receita Federal é conhecida pela excelência em sistemas de informação, mas em pontos de fronteira terrestres todas as informações ainda são registradas em papel”.
A diretora Parlamentar do Sindireceita, Sílvia Felismino, afirmou que a Aduana brasileira é um problema nacional e destacou que a classificação do Brasil na Organização Mundial das Aduanas (OMA) está entre as piores do mundo. “Perdemos para nações em completo subdesenvolvimento. O Brasil chegou ao ranking de aduana mais morosa do mundo. A morosidade tira, em muito, a competitividade do comerciante honesto, do importador honesto, do exportador honesto. As exigências burocráticas e as minúcias praticamente servem de incentivo ao comerciante para deixar de ser honesto. A Frente tem o intuito de facilitar a vida do cidadão brasileiro e do comerciante que quer trabalhar dentro das regras e dificultar a vida do crime. A nossa legislação é atrasada. O serviço público evoluiu, o Brasil evoluiu, mas a legislação aduaneira continua ultrapassada”, disse. “A Frente tem o intuito de facilitar a vida do cidadão brasileiro, do comerciante que quer trabalhar dentro das regras e dificultar o crime”
Sílvia Felismino
Uma melhor integração dos órgãos que atuam na Aduana brasileira, a carência de pessoal e a ausência de uma política de incentivo àqueles que estão nos pontos de fronteira foram os temas consensuais debatidos durante a audiência pública.
Para o coordenador estadual da frente, deputado Frederico Antunes (PP), deveria haver uma FG (Função Gratificada) ou algum tipo de tratamento remuneratório para os servidores que estão prestando serviço distante, em faixa de fronteira. “Não deve ser levado em conta só a distância, mas o risco, a segurança pessoal e outros detalhes. Esse problema tem de ser observado, senão a situação continuará a mesma”, disse o deputado referindo-se a um política de manutenção dos servidores que atuam na Aduana. Na sua avaliação, há a necessidade de se ter um tratamento diferenciado como forma de incentivo aos concursados de órgãos públicos na região.
Também participaram da audiência os deputados Ronaldo Zülke (PT), Paulo Azeredo (PDT), Zilá Breitenback (PSDB), Silvana Covatti (PP), Ronaldo Zülke (PT) e o deputado Fabiano Pereira (PT), presidente da Comissão de Serviços Públicos que acolheu a iniciativa de lançamento da frente.
Cerca de 100 Analistas-Tributários ativos e aposentados, delegados sindicais de diversas cidades do RS e de outros estados, e membros do CEDS-RS acompanharam o debate sobre a Aduana brasileira. O evento contou ainda com a presença do presidente do Conselho Nacional de Representantes Estaduais (CNRE), Gerônimo Sartori, e do diretor de Formação Sindical do Sindireceita, Sérgio Castro. $