Assédio Moral
Não fique em silêncio, denuncie!
A violência moral no ambiente do trabalho não é um fenômeno novo. É uma manifestação que está presente no cenário mundial, atinge homens e mulheres, altos executivos e trabalhadores braçais, a iniciativa privada e o setor público.
Considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a autoestima e a segurança de um indivíduo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência. Isso implica em dano ao ambiente de trabalho, à estabilidade e à evolução na carreira profissional. Algumas das formas como o assédio moral se concretiza são, por exemplo: marcar tarefas com prazos impossíveis, passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais, tomar crédito de ideias de outros, ignorar um funcionário dirigindo-se a ele por meio de terceiros, sonegar informações de forma insistente, espalhar rumores maliciosos, criticar com persistência e subestimar esforços.
O tema foi abordado pela professora do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho e do Programa de Pós-graduação em Psicologia Social e do Trabalho e das Organizações (PSTO) do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), Ana Magnólia Bezerra Mendes, que participou do programa “Receita de Cidadania”, apresentado pelo presidente da entidade, Paulo Antenor de Oliveira.
De acordo com a professora Ana Magnólia, o assédio moral existe no Brasil desde a escravidão, mas somente na atualidade esse debate ganhou destaque. “O Brasil tem abordado o assunto com mais seriedade recentemente. Há três ou quatro anos foram criadas algumas leis e outras ainda estão em andamento. Vários sindicatos e órgãos de representação de trabalhadores também estão mais preocupados com essa temática em razão do aumento das denúncias”, destacou.
O assédio moral é uma prática de discriminação, de desrespeito e de agressão. Para a professora, que também é coordenadora do Laboratório de Cultura e Saúde nas Organizações (LACSO) e do Grupo de Estudos e Pesquisa em Saúde e Trabalho (GEPSAT), esse debate está mais intenso em função da precarização das relações de trabalho. “O medo do desemprego, as ameaças, os quadros das empresas cada vez mais enxutos, com sobrecarga de produção, muitas regras e metas para serem cumpridas, tem feito com que as pessoas fiquem mais sensibilizadas, sentindo-se ameaçadas e envolvidas numa rede de perseguição, de discriminação e agressão”, revelou. Esse conjunto de ações pode ser voltado para uma pessoa ou para um grupo com o objetivo de fazer a vítima desistir de uma ideia, de um projeto, ou até mesmo do emprego. Muitas vezes acontecem agressões pontuais, discriminação e desrespeito, mas não se caracteriza assédio moral. Já o uso abusivo do poder, de forma deliberada e constante, é considerado assédio moral. Ele pode ser praticado de forma explícita ou sutilmente. “Explicitamente poderia ser: você chega no seu trabalho e não tem mais lá a sua mesa, ou o seu computador foi adulterado, ou o chefe te humilha perante o público, ou faz a adulteração das suas informações. Há formas até mais diretas, por exemplo: coloca o indivíduo num lugar isolado, virado para a parede, ou comete atos de humilhação pública. A forma sutil é aquela em que todo dia o assediador vai junto ao funcionário e diz alguma coisa que vai minando a autoimagem e a autoestima dele. É uma forma indireta de o chamar de incompetente. Existem muitas situações de pessoas que saíram de seus empregos porque adoeceram em função da agressão constante”, alerta. Segundo Ana Magnólia, o assédio pode existir também entre o próprio grupo, ou seja, entre os colegas de trabalho. Além disso, pode haver assédio moral em outros contextos, como dentro do núcleo familiar ou na escola. “Onde existe relação de dominação e de poder o assédio moral pode acontecer. As consequências são graves levando a vítima a adoecer, à depressão, a problemas psicossomáticos, como obesidade, diabetes, entre outros. A recuperação é um processo muito longo, mas a pessoa consegue se restabelecer”, acredita.
A pesquisadora destaca que, de acordo com os estudos, o fenômeno do assédio moral está envolvido em uma rede. “Um indivíduo, em um determinado momento, foi um assediador e, em outro momento, foi assediado. Não trabalhamos com a ideia de que o assediador tenha uma maldade intrínseca, ou um desvio psicológico que leve a isso. Qualquer um pode estar numa posição e passar para outra. A mesma pessoa pode estar nos dois papéis”, ressalta. “Há uma pesquisa que mostra que uma pessoa, num determinado momento, foi o assediador e em outro o assediado. Estudos demonstram que quem faz o assédio não tem uma maldade natural, um perfil psicológico que leve a isso. É uma situação contextual, muito ligada ao clima da empresa e a modelos de gestão. É uma empresa onde, por exemplo, só funciona com chicote? Ou é uma empresa onde há espaço para negociar? Ou seja, o funcionário é tratado como gente ou de forma desumanizada como máquina? As próprias normas e modelos gerenciais favorecem situações de assédio. Assim, qualquer um pode estar numa posição e passar a outra, inclusive chefes, que praticaram o assédio moral, podem perde o cargo para um funcionário que fará o mesmo com ele. Isso mostra que não existe um perfil nem de assediador ou de assediado, ou de vítima”.
Como o assediado deve agir para manter o equilíbrio psíquico e emocional? Segundo a professora Ana Magnólia, é preciso buscar o apoio dos colegas e familiares.“É importante manter, o máximo possível, uma rede social dentro da empresa. Hoje, além da vítima, o grupo de colegas fica em silêncio e não têm como denunciar. O próprio assédio serve como exemplo para que se você tomar uma atitude igual àquele colega vai acontecer o mesmo com você. A forma de lidar com isso é construindo uma rede social. É poder conversar sobre o trabalho com os próprios colegas, montar uma rede também no sindicato, buscar apoio na família ou em uma rede social fora da empresa. Se perceber que o chefe está tratando mal relate a situação para alguém, não fique calado”, aconselha.
No Brasil, a legislação com o objetivo de prevenir o assédio moral e punir o assediador ainda é modesta, não possuímos uma lei de âmbito nacional, mas nas cidades brasileiras de Americana/SP, Campinas/SP, Cascavel/PR, Guarulhos/SP, Iracemápolis/SP, Jaboticabal/SP, Natal/RN, Porto Alegre/RS, São Gabriel do Oeste/MS, São Paulo/SP, Sidrolândia/MS, Ubatuba/SP, Araraquara/SP, Amparo/SP, Santa Maria/RS e Contagem/MG, já foram aprovados os ordenamentos jurídicos que coíbem o assédio moral. No Congresso Nacional, há pelo menos sete projetos de lei que tratam da fundamentação e punição contra a prática do assédio moral aguardando votação. $
Como agir?
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