O Estado de S. Paulo/SP – 11/07/2011
As discussões sobre a reforma tributária mal começaram - e ninguém sabe se terão sucesso desta vez -, mas uma coisa já está clara: para avançar, o governo federal terá de abrir o cofre. A rodada de conversas que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez com governadores resultou numa longa lista de exigências que têm em comum a mira apontada para o Tesouro Nacional.
O governo já cedeu em alguns pontos, mas a conta ainda não foi fechada. "Nem fizemos os cálculos", disse ao Estado o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa. "Mas eles não podem querer que fique tudo com a União."
Os governadores querem, em primeiro lugar, garantias que não vão perder arrecadação com a mudança que o governo quer fazer com a principal fonte de receitas dos Estados, o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
O que o governo federal quer é regular apenas um ponto, que diz como será dividida a arrecadação quando uma mercadoria for produzida em um Estado e consumida em outro.
Hoje, os Estados produtores ficam com 7% ou 12% do ICMS cobrado e os Estados consumidores, com o restante da alíquota (se o produto for tributado a 18%, por exemplo, ele fica com 11% ou 6%). A proposta é reduzir a tributação na origem para 4%, dependendo da negociação.
Estados que mais produzem do que consomem, como São Paulo, tendem a perder com a mudança. Na via contrária, Estados pequenos do Nordeste devem ganhar.
O governo já concordou em criar um fundo de ressarcimento de receitas. Mas os Estados estão escaldados por outro fundo criado no fim dos anos 1990 para ressarci-los pelas perdas da Lei Kandir. Eles se queixam que os repasses não repõem as perdas. O governo federal alega que o ressarcimento já nem deveria mais ser pago. Por isso, o novo fundo terá de ter garantias adicionais para convencer os governadores. Alguns propõem até que a reposição de receitas seja prevista na Constituição.
Técnicos suspeitam que a perda dos Estados não seja tão grande assim. Isso porque a maioria deles já não cobra integralmente o ICMS interestadual, porque concederam descontos especiais para atrair empresas, na "guerra fiscal". Nesse caso, quem perderia com a mudança não seria os Estados, mas as empresas.
Para elas, o governo federal acena com descontos em tributos federais, como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o PIS-Cofins, como forma de manter a vantagem tributária por estar localizado longe dos centros do País. Esses descontos fariam parte de uma política de desenvolvimento regional, que também teria apoio de um fundo com recursos federais.
A maior parte dos Estados beneficiários, do Norte, Nordeste e Centro Oeste, prefere que em vez de dar incentivos fiscais o governo federal coloque dinheiro em um fundo a ser administrado pelos governadores. Isso daria a eles mais controle sobre quais empresas atrair.
Juros. Outra promessa já feita por Guido Mantega que vai custar caro ao Tesouro Nacional é a mudança na regra de correção das dívidas que Estados têm com a União. Isso não tem a ver com a reforma tributária, mas também afeta o caixa dos governadores.
Hoje, a dívida é corrigida pela variação do Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), acrescida de juros que podem ser de 6%, 7,5% ou 9% ao ano.
Nos últimos 14 anos, quem pagou juros de 7,5% ou 9% arcou com uma dívida mais cara do que a taxa Selic. O ministro já concordou em baratear a dívida. A proposta é limitar seu crescimento à variação da taxa Selic.
Os governadores, porém, exigem mais. Os do Norte, Nordeste e Centro Oeste já formalizaram em carta que querem a troca do indexador para o IPCA, com juros de 2% ao ano.
Os Estados do Centro Oeste querem suporte do Tesouro para outro ponto: a mudança de critérios na distribuição do Fundo de Participação dos Estados (FPE). O STF considerou inconstitucional a forma como esse fundo é distribuído. Deu prazo para o Congresso definir novos critérios até 31 de dezembro de 2012.
Qualquer que seja a decisão, porém, já se sabe que alguns Estados ganharão e outros perderão. A proposta é que o Tesouro recomponha a receita dos que passarão a receber menos FPE.
Pode sobrar para o cofre federal outra conta, a dos royalties do pré-sal. A divisão desse bolo bilionário gera disputas entre os Estados produtores, historicamente beneficiados, e os não produtores, que agora passarão a receber uma parte dos recursos.
A tendência é que essas discussões sejam feitas em conjunto, já que tudo diz respeito às finanças dos Estados.