CORREIO BRAZILIENSE – DF – 22 de julho
OPINIÃO - Joaquim Falcão
Quem acessar o Portal da Transparência do governo federal vai constatar que, no ano passado, a Coordenação de Administração da Polícia Federal (responsável pelas grandes operações do DPF) gastou R$ 6,34 milhões em diárias. Este ano, até agora, gastou apenas R$ 489 mil. Ou seja, 13 vezes menos. O que esse fato significa?
Primeiro, e não é segredo para ninguém, significa que o governo federal está fazendo um grande esforço para cortar gastos públicos. É o que recomendam os economistas para diminuir o deficit público, segurar a inflação e baixar os juros. Mas significa também que, sendo a competência constitucional da Polícia Federal de âmbito nacional, sem viagens ou diárias, fica mais difícil fazer as investigações necessárias. Cumprir com sua missão. Fazer cumprir leis custa caro. Dado o caráter interestadual de grande parte das operações, diárias viabilizam leis. Sem elas, essas perdem efetividade.
A drástica diminuição de custos indica que não se trata de mero controle de desperdício, o que seria saudável. Para sua ação no Rio de Janeiro, a Polícia Federal gastou no ano passado, com diárias e passagens, R$ 1,41 milhão. Este ano, R$ 182 mil, ou seja, sete vezes menos. Em São Paulo, gastou R$ 2 milhões, contra R$ 88 mil agora; no Pará, R$ 1,12 milhão, contra R$ 175 mil. Existe uma correlação entre os gastos públicos de fiscalização e a efetividade da lei. É inevitável.
Não temos dados mais precisos. Mas tudo indica que o número de operações da Polícia Federal já diminuiu este ano. Controlado como já estava sendo feito, o aspecto de espetáculo e eventuais abusos e violações aos direitos individuais, pode-se perguntar: será bom para o país essa redução tão drástica dos meios disponíveis para a Polícia Federal? Muitas pesquisas de opinião pública mostram que a questão da segurança tende a passar, se é que já não passou, todas as demais questões - educação, saúde e desemprego - como preocupação maior do cidadão eleitor.
Cortar diárias é contabilmente fácil e midiaticamente positivo. Em geral, associa-se corte de diárias à redução de viagens burocráticas desnecessárias. Mas há diárias e diárias. Há viagens desnecessárias e viagens necessárias. No caso, as operações, por questões de segurança, são realizadas com efetivos locais e efetivos mobilizados de outros estados ou de Brasília. Não se trata de abrir excepcionalidades orçamentárias. Trata-se de selecionar cortes de gastos públicos que respeitem prioridades de interesse nacional. Defesa, segurança, Justiça e diplomacia são serviços públicos intransferíveis.
A sociedade se indigna com a corrupção, a improbidade administrativa, mas o Ministério da Justiça e a Polícia Federal veem seus recursos drasticamente reduzidos para que os fatos denunciados sejam eficientemente apurados. Cria-se clima político de desesperança.
Fica difícil obter uma melhor defesa da Amazônia, área de violência no campo e de desmatamento. Operações da Polícia Federal já foram aí reduzidas. O controle de CONTRABANDO de armas - que, como já alertou Beltrame, sustenta no Rio de Janeiro milícias e tráfico de drogas - fica também mais difícil. O Ministério da Justiça necessita desses recursos. Diárias, como no caso, por incrível que pareça, são gênero de primeira necessidade. Aqui não se discute, como na política econômica, a redução da presença do Estado. Aqui a sociedade precisa de mais e mais qualificada presença do Estado.
* Joaquim Falcão - professor da escola de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV)