Se a inflação do próximo ano ficar em 4,8%, taxa utilizada pelo Ministério do Planejamento na montagem do Orçamento, haverá uma pequena redução da despesa com pessoal em termos reais. É bom lembrar que existe o chamado "crescimento vegetativo" da folha de pessoal, em torno de 3% ao ano, que ocorre mesmo quando o governo não concede aumentos de salários. Esse crescimento resulta de vantagens que os servidores têm direito, como anuênios ou quinquênios etc.
O aumento do gasto com pessoal decorrente de reajustes salariais é muito pequeno, de apenas R$ 1,65 bilhão, de acordo com o Anexo V da proposta orçamentária. Estão previstos reajuste de salários apenas para algumas categorias de servidores do Executivo. A União vai gastar um pouco mais com a contratação de novos servidores no ano que vem. Essa despesa ficará em R$ 2,1 bilhões.
Após os aumentos generalizados concedidos pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2008, 2009 e 2010, o governo Dilma Rousseff considera que os salários de todo o funcionalismo federal estão alinhados e decidiu dar uma parada. Na verdade, essa foi a estratégia montada desde o governo anterior. Mas como a inflação está muito alta no Brasil, é muito provável que os servidores intensificarão os movimentos por novos reajustes.
A recomposição das perdas salariais provocadas pela inflação é um dos argumentos utilizados pelos servidores do Judiciário em seu pedido de aumento. Se está convencido de que os salários estão mesmo alinhados, o governo deveria ter pensado em um reajuste salarial linear para todos os servidores da União, mecanismo previsto na Constituição, com o objetivo de minimizar a erosão inflacionária. Sem isso, as pressões dos servidores sobre os parlamentares por novos aumentos poderão "desalinhar" tudo novamente.
A contenção das despesas com pessoal abre espaço, na peça orçamentária, para o aumento de outros gastos. Elas são, nesse sentido, uma espécie de variável de ajuste das contas públicas no próximo ano. A previsão do governo é que as despesas com benefícios previdenciários em 2012 crescerão 13,6% em comparação com o gasto deste ano. Essa elevação decorrerá, é claro, do reajuste de cerca de 14% para o salário mínimo a partir de janeiro.
A proposta orçamentária prevê também um forte crescimento dos gastos com educação (mais 33%) e com saúde (14,8%). As despesas primárias como um todo (não consideram os pagamentos de juros e nem as amortizações das dívidas) vão crescer 15,4% no próximo ano, muito acima da expansão nominal do Produto Interno Bruto (PIB), o que mostra que o Orçamento projetado pelo governo para 2012 é claramente expansionista.
Há aspectos que desequilibram a proposta orçamentária e que precisam ser considerados. Para acomodar todas as despesas previstas para 2012, o governo foi obrigado a reduzir a sua meta de superávit primário em R$ 25,6 bilhões. Ou seja, o Orçamento já chega ao Congresso necessitando de um contingenciamento de R$ 25,6 bilhões para que a meta fiscal "cheia" seja alcançada. É importante fazer essa observação para que não se atribua depois a responsabilidade do contingenciamento unicamente aos deputados e senadores.
Mas existem outras razões para o desequilíbrio da proposta. Uma despesa de R$ 3,9 bilhões, por exemplo, não foi incluída nas contas: a compensação da União aos Estados, por conta da desoneração tributária autorizada pela chamada Lei Kandir. Todos os anos, os governadores pressionam e o governo acaba pagando.
Também é pouco provável que o governo consiga obter a receita que projetou para 2012, equivalente a 24,2% do PIB. Ela é maior do que a prevista para 2011, equivalente a 23,7% do PIB. A estimativa dessa arrecadação foi feita com base em um crescimento da economia de 5%, o que está muito acima da previsão dos analistas do mercado. É como se fosse possível acreditar que, no próximo ano, o Brasil crescerá mais do que em 2011, mesmo com a desaceleração da economia mundial.
Esse desequilíbrio orçamentário mostra que, se quiser mesmo obter a meta cheia de superávit primário em 2012, o governo terá que fazer um grande corte nos investimentos públicos. A tesoura não poderá atingir os gastos correntes porque eles aumentarão muito em decorrência do impacto da elevação do salário mínimo nas despesas com benefícios previdenciários e assistenciais.
Para obter a meta, o corte nos investimentos será inevitável mesmo com a contenção dos gastos com a folha de pessoal. Como esse corte contraria todo o discurso do governo Dilma até aqui, o mais razoável é acreditar que a meta "cheia" de superávit primário não será cumprida no próximo ano.