Presidente do Coaf diz que órgão não ameaça sigilo

Consultor Jurídico
11/01

O envio de movimentações financeiras (com nomes e valores) à Polícia Federal ou ao Ministério Público não é quebra de sigilo, afirma o presidente do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf), Antônio Gustavo Rodrigues. “Não temos acesso às contas bancárias ou aos extratos, só aos comunicados que nos são enviados [pelas instituições financeiras]”, diz Rodrigues.

A defesa vem após declarações do ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio de que o Coaf “tem um encontro jurisdicional marcado” com o tribunal este ano. O presidente do órgão disse à revista Consultor Jurídico que “se for provado que o que fazemos [no Conselho] é inconstitucional, simplesmente fecharemos o Coaf e vamos fazer outra coisa”. O ministro havia dito, ainda que é inconcebível que dados bancários de um cidadão sejam acessados por um órgão do Ministério da Fazenda que os repassa a outros órgãos administrativos.

Para partidários de Marco Aurélio nessa discussão, como o criminalista Jair Jaloreto Júnior, toda quebra de sigilo para fins judiciais tem que ser precedida por ordem judicial. No caso do Coaf, as informações sobre movimentações financeiras são enviadas antes mesmo que haja investigação. “O órgão é um banco de dados público, com informações absolutamente sigilosas que só deveriam ser acessadas com autorização judicial.”

O funcionamento do órgão, afirma Rodrigues, é o mesmo aplicado nas 35 maiores economias do mundo. “Isso não é uma jabuticaba, uma invenção brasileira. É um sistema aplicado no mundo inteiro para combater a lavagem de dinheiro”, explica. A ideia de mandar as informações colhidas para um juiz ou esperar uma ordem judicial para enviá-las à polícia é refutada por ele. “Não faz sentido fazer isso, a não ser que seja para o órgão não funcionar”.

Para o criminalista e professor de Direito Penal da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Mauro César Arjona, o funcionamento do Coaf é uma “inversão explícita da ordem”, uma vez que a denúncia já é feita com a movimentação financeira em mãos. O andamento correto, defende o advogado, seria que houvesse primeiro uma suspeita sobre lavagem de dinheiro, depois investigação, então a identificação do possível crime e, após a reunião de subsídios, o pedido de quebra de sigilo. “Eles notificam sobre movimentação suspeita, mas é suspeita para quem? Ao suspeitar de alguém, o Coaf tenta competir com o Judiciário.”

Barbatana de golfinho
Defendendo que não faz queixa-crime nem denúncia, o presidente do órgão afirma que, sem sua função, a polícia e o MP não teriam de onde partir. Como analogia ao seu trabalho, ele explica que “golfinho também tem barbatana”, e a função da polícia e do MP seria identificar golfinhos e tubarões, enquanto a do Coaf é unicamente apontar as barbatanas que aparecem.

O criminalista Alberto Zacharias Toron concorda. Para ele, “de nada adiantaria ter o Coaf sabendo de movimentação atípica se ele não pudesse encaminhar para outros órgãos que investiguem”. Ainda de acordo com Toron, se o órgão não comunicar tais movimentações, poderia ser detectada “prevaricação”.

A discussão só terá fim (ou será ainda mais acentuada) quando o STF julgar o Recurso Extraordinário 601.314, que teve repercussão geral reconhecida no tribunal em 2009. O RE questiona acórdão que entendeu pela constitucionalidade do artigo 6º da Lei Complementar 105/2001, no tocante ao fornecimento de informações sobre movimentação bancária de contribuintes, pelas instituições financeiras, diretamente ao Fisco por meio de procedimento administrativo, sem prévia autorização judicial. Até lá, o presidente do Coaf pretende criar uma resolução guarda-chuva, que sirva para todos os setores da economia, fazendo com que o órgão receba mais informações, principalmente sobre transações em dinheiro vivo, aumentando, assim, o banco de dados e seu poder.