Valor Econômico - 22/01/2013
O governo vai abrir mão de uma arrecadação equivalente a cerca de um terço do superávit primário esperado ou quase tanto quanto pretende investir no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) neste ano em desonerações tributárias. Levantamento feito pela RECEITA FEDERAL a pedido do Valor (17/1) revelou que as desonerações tributárias devem somar R$ 53,2 bilhões neste ano, para um superávit primário projetado em R$ 155,9 bilhões, e R$ 52,2 bilhões em investimentos do orçamento fiscal no PAC. O mesmo levantamento mostra que as desonerações tributárias serão 16,5% maiores em 2014 e chegarão a R$ 62 bilhões.
Ao longo dos dois últimos anos, o governo adotou medidas para estimular a economia, como a desoneração da folha de pagamentos e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), ou para conter a inflação, como a redução dos tributos incidentes sobre a gasolina e o diesel, que implicaram a perda de arrecadação.
A maior conta pendurada no Tesouro é a desoneração da folha de pagamentos, que começou com o Plano Brasil Maior, em agosto de 2011, beneficiando apenas quatro setores. Em abril de 2012 foram agregados mais 11 setores; posteriormente 25 e, neste ano, mais 2, construção e varejo, totalizando 42.
Pelas regras do programa, esses setores foram beneficiados com a troca da contribuição patronal de 20% sobre a folha de pagamentos para a Previdência por uma alíquota de 1% a 2% sobre o faturamento bruto. O programa ainda não está valendo para todos os setores beneficiados porque é necessária a aprovação pelo Congresso e um período de noventena para entrada em vigor. Por isso, em 2012, a desoneração significou para o governo abrir mão de apenas R$ 3 bilhões em arrecadação com a mudança na contribuição sobre a folha. Mas, neste ano, o valor vai saltar para R$ 13,3 bilhões e, em 2014, para R$ 16,2 bilhões, segundo o levantamento da RECEITA FEDERAL.
As principais beneficiadas pela desoneração da folha são empresas do setor industrial, que economizarão R$ 9,1 bilhões em contribuições neste ano, seguidas por companhias de transporte, com R$ 2,2 bilhões, e serviços, por R$ 1,6 bilhão. De acordo com o governo, os 42 setores beneficiados são responsáveis por 59% das exportações de manufaturados do país, 22% das exportações totais, um terço dos trabalhadores contratados pela CLT, 24% da massa salarial e 19% da receita bruta da economia.
Em seguida, a desoneração tributária de maior valor é a redução a zero das alíquotas da Cide para a gasolina e o diesel, que resultou em uma perda de arrecadação de R$ 11,4 bilhões neste ano e outro tanto em 2014. No ranking das renúncias fiscais do governo vem então a redução do IPI para uma série de produtos, que totalizou R$ 7,8 bilhões, dos quais R$ 4,5 bilhões apenas com automóveis, caminhões, eletrodomésticos da linha branca e móveis. Essa conta vai diminuir para R$ 5 bilhões em 2014 porque haverá a recomposição do tributo em alguns produtos como automóveis. O governo ainda abriu mão de R$ 3,6 bilhões em arrecadação neste ano e de quantia igual em 2014 com a redução do IOF do crédito para pessoas físicas, de 2,5% para 1,5% ao ano. A conta da Receita não inclui a reforma do PIS e da Cofins, que ainda está sendo detalhada e pode resultar em renúncia fiscal de R$ 9,8 bilhões no ano.
Para tentar garantir que o desempenho econômico deste ano seja melhor do que o decepcionante índice esperado para 2012, setores do governo têm sinalizado que gostariam de antecipar a implementação do projeto de ampliar a desoneração da folha de pagamentos a todos os negócios em que a troca é vantajosa - existem alguns em que é melhor manter a contribuição sobre a folha.
Esse plano esbarra, porém, na legislação. Conforme o secretário do Tesouro, Arno Augustin, disse em entrevista ao Valor PRO, na sexta-feira, na interpretação do Tribunal de Contas da União (TCU), o artigo 14 da LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL (LFR), um dos pilares da gestão fiscal do Estado, proíbe a redução da carga tributária no Brasil, sem que haja uma contrapartida de outra fonte de receita, a não ser que isso esteja previsto no Orçamento. Para Augustin, é "correto" o objetivo de "preservar fiscalmente" o Orçamento. Mas redação do artigo precisa ser melhorada para que se possa "reduzir a carga tributária".
Reduzir a carga de impostos é um objetivo louvável, mas que deveria fazer parte de um projeto mais amplo de revisão das regras tributárias, que está longe de se limitar às contribuições previdenciárias e a medidas casuísticas.