G1 - 10 de junho de 2015
A presidente Dilma Rousseff deve aproveitar a ida a Bruxelas nesta quarta-feira (10) para tentar reforçar a agenda positiva do governo e buscar acordos comerciais que possam ajudar o país a sair da crise, segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Até quinta-feira (11), a presidente participa da cúpula União Europeia – Celac (que reúne países da América Latina e do Caribe), sua primeira reunião fora do continente americano no segundo mandato.
Os especialistas afirmam que, com a crise econômica, o governo precisa expandir seus negócios. Por isso, está sendo obrigado a buscar uma política comercial mais agressiva com outros países – já foram anunciadas acordos com China e México.
Na Europa, a expectativa é de que avancem as negociações para o tratado de livre comércio entre Mercosul e União Europeia – que se arrastam desde 2010, com forte resistência da Argentina.
Em entrevista à rede alemã Deutsche Welle, Dilma disse que, em Bruxelas, os países do Mercosul devem marcar o prazo para entregar suas ofertas do acordo.
"Do ponto de vista do Mercosul, principalmente do ponto de vista do Brasil, é prioritário, neste ano de 2015, que a gente chegue a esse acordo", disse.
Para isso, a presidente falou até na possibilidade de fazer um acordo com "ritmos diferenciados" – ou seja, o Brasil e outros países iniciariam a negociação sem a Argentina, que poderia aderir depois.
Na chegada à Bruxelas, a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, disse que, em seu discurso, a presidente deve dizer que o Brasil está pronto para a troca de ofertas com a UE. Em reuniões bilaterais com líderes europeus – ela tem encontro marcado com a chanceler alemã Angela Merkel, por exemplo –, Dilma deve pedir que isso seja feito até julho.
"Seria o ideal [a Argentina] aceitar, mas se não quiserem aceitar, ou vem ou vai ficar", disse a ministra.
A preferência do governo, no entanto, é fazer a negociação incluindo a Argentina.
"Mas é uma grande mudança, a crise forçou o governo a repensar a estratégia dos últimos 12 anos", diz o professor de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, Oliver Stuenkel.
"Antigamente, o Brasil tinha uma postura rigorosa de fazer acordos multilaterais. Agora está se abrindo mais para a possibilidade de acordo bilaterais."
Agenda positiva
A viagem também serve, seguindo especialistas, para anunciar medidas que possam melhorar a imagem do governo.
"Essas viagens integram a agenda positiva, tentam tirar o foco da questão interna – inflação alta, desemprego – e jogar nas viagens, que sempre trazem notícias positivas, como convênios", diz o cientista político Ricardo Ismael, da PUC-RJ.
Dilma embarcou para a Europa no mesmo dia em que o governo lançou um pacote de concessões privadas que também integra a "agenda positiva" – e para o qual precisa atrair investidores.
"A Lava Jato vai abrir muitas oportunidades na área de infraestrutura e construção civil, porque algumas construtoras não vão aguentar. Falta saber se os investidores estrangeiros já vão se sentir seguros a ponto de ir para o Brasil", diz o cientista político Fernando Abrucio, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
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Segundo Stuenkel, o Brasil chega à Europa com menos projeção que tinha há alguns anos. Mas ele afirma que a viagem de Dilma ocorre após o pior momento da crise no país.
Dilma vai chegar depois da abertura do congresso, esquivando-se de possíveis protestos de integrantes do PT contra o ajuste fiscal
"A preocupação com o impeachment passou, ela não é mais vista como uma líder que pode cair a qualquer momento. A avaliação internacional é que os últimos meses fizeram parte da transição e que o segundo mandato está mesmo começando agora."
Abrucio acrescenta que a viagem também foi possível porque, internamente, a crise também amainou: a população saiu das ruas, o Congresso aprovou quase todas as medidas do ajuste e os presidente da Câmara e do Senado estão mais fracos.
Por coincidência, a cúpula pode evitar que Dilma enfrente uma tensão com integrantes do PT contrários ao ajuste fiscal. Talvez ela não retorne em tempo de participar da abertura do congresso da sigla – e, com isso, poderá se esquivar de possíveis protestos contra o ajuste fiscal conduzido por seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Cúpula
A cúpula Celac-União Europeia vai reunir representantes de 61 países da América Latina e Caribe e do bloco europeu. Ainda não se sabe se alguma medida prática constará nos documentos que serão produzidos ao final do encontro.
Uma das expectativas é que seja anunciada a contribuição da Europa para a construção de um cabo submarino de transmissão de dados ligando Fortaleza a Lisboa.
Na última reunião de cúpula da Celac, a presidente Dilma Rousseff manifestou a intenção de fazer com que o grupo se voltasse mais para a área comercial.
Por isso, aumenta a importância do encontro com a União Europeia – que, se fosse um país, seria o maior investidor na América Latina.
A América Latina, no entanto, encontra-se em uma situação menos atraente do que quando foi realizada a primeira cúpula UE-Celac, em 2013.
Naquele momento, a expectativa de crescimento do PIB da região era de quase 4% – para 2015, segundo o FMI, a projeção é de 0,9%. Já a Europa enfrenta um cenário um pouco melhor neste momento do que há três anos.
"A cúpula chega em bom momento, porque a Europa está saindo da crise e há uma desaceleração na América Latina", disse Benita Ferrero-Waldner, presidente da Fundação EU-LAC (sigla em inglês para UE, América Latina e Caribe).
Na opinião dela, até antes da crise, a Europa "dava lições" e agia de forma complacente com a América Latina. Agora, isso acabou, e é mais fácil que os dois se vejam como parceiros para estimular ambas as economias.