Jornal do Comércio - 18 de julho de 2016
Falta de qualificação de trabalhadores e Custo Brasil estão entre os empecilhos
0 abismo que separa a produtividade brasileira da norte-americana não para de crescer. Enquanto os Estados Unidos conseguem fabricar um produto com apenas um trabalhador, no Brasil, a mesma peça exige quatro pessoas. É a pior relação desde a década de 1950, quando o País vivia os re flexos da industrialização iniciada 20 anos antes. A má notícia é que, com inúmeros gargalos para serem superados e afundado numa das piores crises da história, o País não esboça nenhuma reação para reverter esse quadro no curto e médio prazos.
No fim do ano passado, um trabalhador brasileiro era capaz de produzir US$ 29.583 e um norte-americano, US$ 118.826, segundo levantamento do Conference Board, compilado pelo pesquisador Fernando Veloso, do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Nas palavras do Nobel de Economia, Paul Krugman, "produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo". Na prática, ela está diretamente relacionada às riquezas geradas por um país e seu comportamento deter mina o padrão de vida da sociedade.
Até 1980, o Brasil conseguia melhorar a sua produtividade em relação aos concorrentes e diminuir a diferença para os Estados Unidos - hoje considerada a eco nomia mais produtiva do mundo. "Entre as décadas de 1930 e 1970, havia um crescimento fácil da produtividade brasileira por causa do processo de industrialização que levou parte dos trabalhadores rurais para as fábricas - trajetória vivida hoje pela China", afirma a diretora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Fernanda De Negri.
No melhor momento na relação entre os dois países, em 1980, pouco mais de dois trabalhadores brasileiros produziam o mesmo que um americano. A partir daí, no entanto, o cenário mudou e o Brasil foi ficando para trás. Com a abertura comercial, até houve um ganho da produtividade das empresas brasileiras, mas a um custo muito alto por causa da quebradeira de vá rias empresas que não estavam prepara das para a concorrência internacional. "Na indústria, por exemplo, houve um ganho de produtividade muito grande até 1997 e a gente atribui parte à abertura. Ela forçou as empresas a produzirem melhor, mas também eliminou as mais ineficientes", diz Regis Bonelli, pesquisador do IBRI/FGV.
Atualmente, a economia brasileira enfrenta um cenário perverso. O setor produtivo tem dificuldade para aumentar" a sua eficiência porque passou a conviver com problemas que vão da baixa qualificação do trabalhador ao chamando Custo Brasil, que envolve a elevada e complexa carga tributária, excesso de burocracia e má qualidade da infraestrutura - um dos pesadelos das empresas no País.
Sem ferrovias suficientes e com as es tradas em condições precárias, qualquer eficiência conseguida dentro da fábrica é achatada pelos custos logísticos. A Weg, multinacional presente em 11 países, sabe bem o que isso significa. "Nos Estados Unidos, um caminhão consegue percorrer 400 quilômetros (km) num dia. Aqui, conseguimos só 45 km", diz o superintendente administrativo e financeiro, André Luis Rodrigues. Ele destaca que o descumprimento de prazos acarreta multas à - empresa, já que o atraso pode comprometer o andamento de um projeto.
Baixo investimento agrava situação
Parte dos problemas enfrentados pelo Brasil é resultado do baixo investimento nos últimos anos - no primeiro trimestre de 2016, ficou em 16,9% do PIB (na China, é de quase 50% e na índia, 33%). "Menos investimentos significa menos produtividade, do trabalho e de capital. Apenas a qualificação da mão de obra não é suficiente se a empresa não investe em máquinas modernas", diz o economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Indus trial (Iedi), Rafael Fagundes Cagnin.
O motivo, diz ele, é a elevada taxa de juros no País (hoje 14,25% ao ano), que desestimula projetos de expansão e melhorias de eficiência. "Há uma drenagem de recursos que poderiam ir para a produção e vão para o mercado financeiro." Na avaliação do vice-presidente sênior da Basf, Eduardo Leduc, da Unidade de Proteção de Cultivos, o baixo investimento do Brasil é decorrente da falta de previsibilidade e de um plano de governo que indique a direção do País. "Temos feito investimentos elevados, mas poderíamos trazer ainda mais recursos se as condições fossem mais favoráveis. Na disputa com outros países por dinheiro, às vezes a gente perde." Mas, assim como há entraves da por teira para fora, também há problemas da porteira para dentro das fábricas. E uma de las é a gestão ultrapassada de muitas em presas, que continuam administrando os negócios como em décadas passadas. Falta educação para os gestores adotarem práticas modernas de gerenciamento e conseguir elevar o padrão da companhia, afirma o coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, Naercio Menezes Filho.
O quadro da produtividade brasileira é ainda mais dramático quando compara do com outros países. Atualmente, até a China tem se aproximado do Brasil. Neste ano, um trabalhador chinês vai produzir US$ 25.198. "Estamos ficando cada vez mais para trás e isso é resultado do pro cesso de desindustrialização no País", diz o diretor da Federação das Indústrias de São Paulo, José Ricardo Roriz.