Agência Senado - 17/10/2017
Parlamentares defenderam uma lei que regule os acordos de delação e colaboração premiada, na audiência desta terça-feira (17) na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da JBS. O tema foi discutido durante o depoimento do procurador da República Angelo Goulart Villela.
Dividido numa parte pública e outra secreta, por envolver informações em segredo de Justiça, o depoimento durou mais de cinco horas e meia. Villela defendeu-se das acusações que o levaram a passar dois meses e meio preso preventivamente, no primeiro semestre. Ele fazia parte da força-tarefa da Operação Greenfield, que investigava desvios em fundos de pensão. Villela foi acusado de receber dinheiro para vazar dados sigilosos para os donos do grupo J&F.
— Não tenho nada a esconder. O maior interessado no esclarecimento dos fatos sou eu. Fiquei 76 dias custodiado sem oportunidade alguma, exceto uma sindicância disciplinar, para falar sobre os fatos — disse o depoente.
Indagado sobre a colaboração premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista, controladores do grupo J&F, Villela atribuiu os termos e a celeridade do acordo ao desejo do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de derrubar o presidente Michel Temer, para barrar a nomeação da procuradora Raquel Dodge para sucedê-lo na procuradoria.
— O dr. Janot precisava deixar bem claro, neste ambiente midiático que a gente vive, de combate desenfreado à corrupção, de queridinho da mídia, de super-herói, que não havia motivação política. Como ele faria isso? Ora, entregando um membro do Ministério Público. Janot agiu com o fígado em relação a mim — disse, com a voz trêmula.
Villela defendeu o uso das delações premiadas em investigações, mas disse que o episódio mudou sua opinião em relação ao modus operandi das negociações. Para ele, abusa-se da prisão preventiva para obter delações.
— Quando se tem a prisão, sobretudo por muito tempo, é difícil aferir a voluntariedade [de quem delata]. Se tivesse uma única coisa a delatar, eu não passaria 76 dias preso. É difícil demais uma prisão. Só é mais tênue que a violação da dignidade. Isso dói mais que o cárcere.
Segundo ele, não há nenhuma norma regulamentando o procedimento de negociação desse tipo de acordo – apenas em agosto deste ano a Quinta Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF) emitiu uma orientação para a elaboração de acordos de leniência.
— Faço uma sugestão a esta casa: não temos parâmetro normativo algum do modo de conduzir uma delação premiada. Hoje há uma completa zona cinzenta em relação a isso. A gente precisa deixar isso bem claro na legislação — propôs Villela.
Código
O deputado Wadih Damous (PT-RJ), relator da CPMI para investigação de vazamentos e aprimoramento da legislação, anunciou que vai solicitar ao MPF o envio de qualquer código de conduta que regule as negociações de acordos de leniência. O senador José Medeiros (Pode-MT) defendeu uma lei que impeça que o país seja prejudicado por crises políticas sem relação com a situação econômica.
— Toda a nossa República ficou tipo gelatina por causa de um assunto menor, que seria a briga política pela direção da PGR. Isso me faz pensar que precisamos de uma legislação para proteger a República — disse Medeiros.
O presidente da CPMI, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), disse que a comissão pode “contribuir muito com o país”.
— Nós temos condição, sim, de melhorar a legislação, e criar leis boas para o povo brasileiro.
O final da parte pública do depoimento foi marcado por uma discussão entre o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e o relator da CPMI, Carlos Marun (PMDB-MS). Randolfe reagiu à insinuação de que teve acesso a um áudio sigiloso da investigação envolvendo Villela, e denunciou o que chamou de “coalizão ampla” de PT e PMDB na comissão. Ofendido, Marun chamou o senador de “vira-lata”, e Randolfe retrucou qualificando o relator de “lambe-botas” do presidente Michel Temer.