Agenda econômica é o desafio de Alcolumbre em 2020

Valor Econômico - 30 de dezembro de 2019


Presidente do Senado faz defesa enfática de Flávio Bolsonaro e nega espaço a CPIs contra juízes


Moralidade e pauta econômica vão duelar por espaço no Senado em 2020. Presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP) terá o teste definitivo de sua habilidade política, quando tentará fazer caminhar a intrincada agenda econômica pós-Previdência, ao mesmo tempo em que evita investigações a magistrados, confronto entre Poderes e até ações contra o filho do presidente Jair Bolsonaro.Nome do baixo clero até 2018, Alcolumbre foi alçado à condição de líder político após derrotar Renan Calheiros (MDB-AL) na conturbada eleição a presidente do Senado, em fevereiro de 2019. Chegou ao posto respaldado, principalmente, por senadores de primeiro mandato, bolsonaristas ou não, mas alinhados à pauta do combate a privilégios.

De lá para cá, Alcolumbre passou a ser contestado. Acusado de se aproximar da ala da "velha política" do MDB (Renan Calheiros incluso), perdeu terreno entre os novatos, que queriam focar os trabalhos em ações de contestação ao Poder Judiciário, como CPIs para investigar a atuação de magistrados, na abertura de processos de impeachment contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e, nos últimos dias do ano, na aprovação de uma lei que garantisse a prisão após condenação em segunda instância.

Em um café com jornalistas, recentemente, Alcolumbre foi claro ao dizer que não dará prosseguimento a CPIs deste tipo nem ações contra ministros em 2020. Foi mais longe: fez uma enfática defesa do senador Flávio Bolsonaro (sem partidoRJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, descartando a possibilidade de ele ser levado ao Conselho de Ética da Casa pelo possível envolvimento em casos de corrupção da época em que era deputado estadual. "Ele tem o meu respeito, é uma pessoa de bem. O episódio foi fora do mandato [de senador], pode ser de pronto arquivado".

Segunda instância então, nem pensar, afirmou. Em que pese o Senado ter aprovado um projeto sobre o tema na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Alcolumbre não vai pautar a matéria no plenário. Vai aguardar o trâmite da proposta de emenda à Constituição (PEC) que está na Câmara. A Casa vizinha prometeu aprovar a medida até meados de abril e então encaminhá-la ao Senado. Mas se não conseguir, disse Alcolumbre, ele fará o Senado esperar.

É neste cenário que o presidente do Senado buscará emplacar as medidas para destravar a economia, cuja tramitação está quase totalmente concentrada no lado azul do Congresso Nacional no primeiro semestre. Além de discutir as três emendas constitucionais que compõem o pacote Mais Brasil, os senadores terão de apreciar pautas como o novo marco legal do saneamento, a medida provisória do Contrato Verde e Amarelo e uma modificação no modelo tributário, cuja discussão será compartilhada com a Câmara. O relógio joga contra, já que a partir de agosto as atenções estarão voltadas para as eleições municipais.

No mês de janeiro, os partidos devem começar a discutir quais nomes serão indicados para compor a comissão mista da reforma tributária, bem como a MP Verde e Amarela. A medida modifica a CLT em 132 pontos, criando uma modalidade de contratação de jovens de 18 a 29 anos de idade. Os salários são limitados a um salário mínimo e meio por até 24 meses e as empresas contratantes ficam temporariamente isentas de impostos sociais.

Os senadores ainda terão de estudar uma nova proposta de marco legal do saneamento básico, pois a proposta aprovada pela Casa anteriormente foi derrubada pelos deputados. "Causou estranheza [essa manobra da Câmara]. O que eu acho é que o capital privado não vai levar água e esgoto numa cidade como Atalaia Norte (AM), no Vale do Javari, fronteira do Brasil com o Peru", criticou o líder do MDB, Eduardo Braga (MDB-AM).

A primeira matéria que deve, de fato, entrar em votação é a PEC que extingue fundos públicos e integra o pacote Mais Brasil, apresentado pela equipe econômica em novembro. É considerada uma das mais palatáveis pelos congressistas. O relatório já foi apresentado pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), mas a CCJ ainda deve realizar duas audiências públicas sobre o assunto. Ainda assim, a previsão é que a proposta seja aprovada na comissão e levada ao plenário em fevereiro.

A PEC Emergencial, que também integra o pacote, prevê gatilhos, em caso de situação fiscal grave, e uma série de medidas para conter os gastos públicos. O relatório foi apresentado recentemente pelo senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e a ideia da senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da CCJ do Senado, é que também seja apreciada pelos parlamentares em fevereiro. "Já é de conhecimento inclusive do governo que as PECs econômicas, as três, serão discutidas e votadas no mês de fevereiro", explicou Simone.

Na conta da senadora também está a PEC Mais Brasil, que trata do pacto federativo. Essa matéria enfrenta resistência, porém, entre algumas das bancadas no Senado. Um dos itens que mais causaram reação dos senadores foi a possibilidade de extinção de municípios com até 5 mil habitantes que não tenham condições de cobrir pelo menos 10% de suas despesas até 2024. "A proposta promove perda de 50% da arrecadação dos municípios fundidos. Na verdade, a maioria dessas alterações, além de não resolver os reais problemas da administração dos municípios, necessita de um grande diálogo do poder público com o parlamento e, principalmente, com a população", criticou o senador Dário Berger (MDB-SC).

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDBPE), tem apresentado um calendário um pouco diferente, mas igualmente otimista em relação ao pacto federativo. "Todas as três serão aprovadas até 30 de junho. A primeira a ser aprovada deve ser a PEC dos Fundos, até fim de fevereiro. Na sequência, a PEC Emergencial, até o fim de março, e por último a PEC do Pacto Federativo, que é o texto mais amplo e tem forte interesse de Estados e municípios, pois cria outra cultura de gestão de responsabilidade fiscal. Acredito que essa terceira proposição seja deliberada até meados de abril", disse.

No fim do ano, após as eleições municipais, o Senado terá também de sabatinar e avaliar a indicação de um ministro para o Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque o ministro Celso de Mello vai se aposentar e abrirá espaço para que o presidente Jair Bolsonaro indique um magistrado para a Corte. A expectativa é de que o escolhido pelo presidente seja um evangélico, mas este dependerá de aprovação dos senadores para assumir o cargo.