Trabalhadores poderão ter direito a correção maior do FGTS a partir de 1999; entenda

Por Marta Cavallini, G1

13/05/2021 07h00  Atualizado há uma hora

O trabalhador que teve carteira assinada a partir de 1999 poderá ter direito a uma correção maior nos recursos depositados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Supremo Tribunal Federal (STF) deve se reunir para decidir sobre uma ação do partido Solidariedade que questiona o uso da Taxa Referencial (TR) para corrigir esse dinheiro – e, a depender da decisão, o trabalhador pode ter direito a ver o valor depositado no FGTS crescer. Em princípio, o julgamento estava marcado para o dia 13 de maio, mas foi retirado da programação do tribunal e ainda não foi definida uma nova data.

A TR é usada desde 1999 para a correção do Fundo de Garantia e atualmente está em zero. Além da TR, o FGTS tem reajuste de 3% ao ano. A ação direta de inconstitucionalidade, de 2014, argumenta que a TR não pode ser utilizada para atualização monetária por não acompanhar os índices de inflação, o que traz desvantagem para os trabalhadores.

Na ação, o partido afirma que, a partir do segundo trimestre de 1999, a TR passou a ser muito inferior ao IPCA, índice que mede a inflação oficial do país, ficando igual ou próxima de zero. E cita estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), que mostra perda 48,3% nas contas do FGTS em relação à inflação entre 1999 e 2013.

A ação aponta que nem mesmo com os 3% anuais sobre o FGTS foi possível repor as perdas inflacionárias – a partir de 2012, mesmo com esses juros, a correção das contas vinculadas foi inferior à inflação acumulada.

A decisão do STF envolve os seguintes temas:

  • Índice de correção dos valores depositados nas contas vinculadas do FGTS dos trabalhadores: pode decidir pela continuação da TR mais os 3% de correção ou mudar para o IPCA ou INPC mais os 3% de correção ao ano.
  • Quem será beneficiado se houver mudança no índice de reajuste: trabalhadores com carteira assinada entre 1999 e 2013, que é o período citado na ação; de 1999 em diante; ou depósitos feitos a partir da data da decisão do STF – nos três cenários, são incluídas tanto as contas ativas quanto inativas do FGTS.
  • Ação na Justiça: a decisão poderá acolher todos os trabalhadores, independente se entrarem ou não com ação na Justiça, ou somente quem entrou com ação até o dia 13 de maio.
  • Saques: se a mudança no reajuste será para quem sacou ou não os valores do FGTS;
  • Período de correção: se a correção poderá ser referente apenas aos últimos cinco ou 30 anos de depósito do FGTS.

 

OPINIÃO DE ADVOGADOS

Murilo Aith, advogado e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, acha importante o trabalhador ingressar com ação antes do julgamento do STF. Isso porque o Supremo poderá modular os efeitos da decisão para quem estiver com sua ação em andamento até o julgamento.

Mesma opinião tem o advogado Renato Falchet Garacho. “É prudente o trabalhador entrar com ação antes do julgamento, pois o risco de o STF barrar novas ações é grande”, afirma.

Para a advogada Michelle Pimenta Dezidério, especialista em Direito do Trabalho de Chediak Advogados, a alteração do índice de correção monetária sobre os valores depositados nas contas vinculadas ao FGTS pode afetar todos os trabalhadores.

“Se o STF entender que a forma de correção pode ser alterada de forma retroativa, ou seja, atingir os valores que já foram depositados, tantos os empregados que já ingressaram com ações judiciais quanto aqueles que não ingressaram serão beneficiados”, opina.

Michelle pondera que seria inconstitucional a mudança no reajuste atingir apenas quem já ingressou com ação judicial, “já que, havendo a alteração do índice de correção, todos aqueles que possuem valores depositados nas contas vinculadas ao FGTS teriam direito à revisão”.

Segundo ela, dependendo da decisão, haverá uma corrida para o ingresso de ações para o recebimento de eventuais diferenças, até mesmo por aqueles que já sacaram os valores levantados.

 

AÇÕES INDIVIDUAIS OU COLETIVAS?

Os trabalhadores que optarem por ir à Justiça podem ingressar com ações individuais ou coletivas. Para Michelle, as ações individuais acabam tendo o trâmite mais rápido, por isso, a orientação dela é cada trabalhador buscar o advogado de sua confiança.

“É possível ainda que o sindicato ingresse com ações coletivas para garantir o direito de todos os empregados a ele vinculados. Tanto a ação individual como a ação coletiva garantirão os mesmos resultados ao empregado”, diz.

Nesse caso, o trabalhador deve procurar o sindicato de sua categoria e verificar se já não existe uma ação na Justiça pedindo a mudança de correção do FGTS.

Segundo Michelle, a necessidade ou não de advogado para representar o empregado depende do valor a ser requerido. Se o valor que se pretende receber não ultrapassar 60 salários mínimos, o empregado pode buscar o Juizado Especial Federal para ingressar com a ação judicial.

“No entanto, é sempre recomendado que se busque o profissional apto para auxiliar o empregado a ingressar com a ação judicial, uma vez que, havendo necessidade de interposição de recurso no decorrer do processo, será obrigatória a representação por advogado”, ressalta.

Murilo Aith concorda com Michelle. “Pode entrar com ação na primeira instância do Juizado Especial Federal, mas, indo para segunda instância, obrigatoriamente terá de ter advogado, ou seja, é melhor ter o apoio profissional desde o início”.

Aith também sugere sempre ações individuais por serem menos complexas de serem conduzidas e por haver a discussão individual de valores. “Cada caso discute um valor. Vira uma confusão processual se em um único processo discutir os valores de todos os envolvidos”, explica.

Garacho observa que as ações coletivas, salvo raras exceções, misturam muito os cálculos e, para este caso, é basicamente fazer a conta certa.

“O grande problema é que a pessoa precisa contratar ao menos algum especialista em cálculo para saber melhor o valor da causa, por isso um advogado especialista no tema é recomendado, embora não seja obrigatório”, afirma.

 

COMO ENTRAR COM AÇÃO

Murilo Aith diz que, para ingressar com a ação os documentos necessários são os seguintes:

  • RG/CPF ou CNH;
  • Comprovante de residência;
  • Carteira de Trabalho;
  • Extrato analítico do FGTS de 1999 a 2013 (disponível no site www.caixa.gov.br/extrato-fgts); e
  • Carta de Concessão da Aposentadoria (apenas para quem é aposentado).

Segundo Aith, o cálculo da Revisão do FGTS é simples. Basta verificar no extrato analítico os créditos do Juros de Atualização Monetária (JAM) que é feito trimestralmente e substituir a correção do índice, que é a TR, por outro índice mais vantajoso (INPC, IPCA ou IPCA-E). Esse crédito JAM é feito sobre os depósitos de FGTS de forma acumulada.

 

SIMULAÇÕES

Aith afirma que as diferenças nos valores do FGTS levando em conta a correção pela TR e pelo IPCA e INPC chegam a 80%. Veja exemplos trazidos pelo advogado:

  • Saldo da conta do FGTS no valor de R$ 112.010,38 corrigido pela TR: se aplicado o IPCA, o valor teria um acréscimo de R$ 92.751,41 (aumento de 80,48%)
  • Saldo da conta do FGTS de R$ 199.461,84 corrigido pela TR: se aplicado o IPCA-E, o valor teria um acréscimo de R$ 100.001,91 (aumento de 50,13%)
  • Saldo da conta do FGTS de R$ 301.497,75 corrigido pela TR: se aplicado o INPC, teria um acréscimo de R$ 234.115,90 (aumento de 77,65%)

DECISÕES ANTERIORES

O Supremo Tribunal Federal já decidiu pela substituição da TR em julgamentos anteriores –a mais recente, no final de 2020. O STF determinou que é inconstitucional a aplicação da TR para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho.

Até que o Poder Legislativo delibere sobre a questão, devem ser aplicados o Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), na fase pré-judicial, e, a partir da citação, a taxa Selic, para as condenações cíveis em geral.

Em 2019, o STF determinou que o poder público deve corrigir dívidas antigas de precatórios pela inflação, e não pela Taxa Referencial (TR). Precatórios são títulos de dívidas do poder público reconhecidas pela Justiça. Quando alguém ganha um processo na Justiça contra um ente público e tem valores a receber, recebe um precatório e entra na fila do pagamento.