Nos últimos dias, tomamos conhecimento de situação anômala ocorrida no Porto de Itajaí-SC no que concerne a compensação dos dias não trabalhados em virtude das festas de fim de ano de 2011. Adotaram-se dois critérios para a compensação do horário: jornada extraordinária nos sábados para os Analistas-Tributários e dias de sobreaviso para os Auditores-Fiscais.
A compensação de horário está prevista no artigo 44 da Lei 8.112/90, que estabelece que essa deva ocorrer até o mês subsequente ao da ocorrência, na forma a ser estabelecida pela chefia imediata.
Entretanto, o Ofício-Circular nº 9/SRH/MP excepcionou a regra geral para disciplinar o revezamento dos dias não trabalhados nas semanas de 19 a 23 e 26 a 30 de dezembro de 2011. Os servidores que participassem do revezamento teriam a obrigação de compensar as horas não trabalhadas, excepcionalmente, entre 7 de novembro de 2011 a 30 de abril de 2012, havendo ainda a recomendação de que não seja ultrapassado o limite de 1 (uma) hora diária de compensação.
Inicialmente, o inspetor-chefe da Alfândega da RFB do Porto de Itajaí, publicou a Ordem de Serviço ALF/ITJ nº 2/2011, onde prevê três escalas de revezamento, sendo elas de 19 a 23, 26 a 30 de dezembro e 2 a 6 de janeiro de 2012, observando que a compensação diária não deve ser inferior a meia hora e não superior a uma hora no período previsto pelo Ofício-Circular nº 9/SRH/MP.
Entretanto, o que causou perplexidade entre os servidores do Porto foi a previsão contida na Portaria DRF/ITJ nº 54, de 17 de novembro de 2011, onde se aprova escala de sobreaviso para que os Auditores-Fiscais com exercício no Porto compensassem o recesso das festas de final de ano de 2011, escalas essas com início em 3 de dezembro de 2011 e fim em 25 de dezembro de 2012.
Com todo o respeito ao emissor da referida portaria, não podemos deixar de destacar as irregularidades nessa contidas. Primeiro, o período de compensação extrapola o previsto pelo Ofício-Circular nº 9/SRH/MP, lembrando que o emissor da portaria não tem competência para excetuar a regra geral prevista no artigo 44 da Lei 8.112/90. Segundo, a situação de sobreaviso não se encontra regulada no serviço público e tem sido severamente limitada no âmbito da CLT onde é prevista como tempo efetivo de trabalho (art. 244).
Em conformidade à norma vigente, observando as peculiaridades do serviço aduaneiro, não há como entender o estado de sobreaviso como tempo efetivo de trabalho enquanto aquele não se converter em efetiva convocação para a realização de atividades. Como podemos depreender do previsto no artigo 6º, parágrafos 4º e 5º, do Decreto nº 1.590/95, abaixo citado:
Art. 6º O controle de assiduidade e pontualidade poderá ser exercido mediante:
(...)
§ 4º Os servidores, cujas atividades sejam executadas fora da sede do órgão ou entidade em que tenha exercício e em condições materiais que impeçam o registro diário de ponto, preencherão boletim semanal em que se comprove a respectiva assiduidade e efetiva prestação de serviço. (Vide Decreto nº 1.867, de 1996)
§ 5º O desempenho das atividades afetas aos servidores de que trata o parágrafo anterior será controlado pelas respectivas chefias imediatas
A Coordenação de Recursos Humanos do Departamento de Polícia Federal já enfrentou essa discussão no Parecer n/ 1.422/2009-DELP/CRH/DGP/DPF onde conclui que, apesar de possível o regime de sobreaviso há que ser suportado pelo servidor policial sem que isso represente trabalho extraordinário passível de compensação:
“o regime de sobreaviso, corolário do regime de dedicação integral a que está sujeito o policial (artigos 4/ e 23 da Lei 4.878/65), enquanto mera expectativa de trabalho (sem convocação), deve ser suportado pelo servidor policial, sem outras consequências.
Por outro lado, o trabalho efetivamente prestado em razão de acionamento durante o período de sobreaviso deve ser tratado como trabalho extraordinário e devidamente compensado, de forma a não serem extrapolados os limites estabelecidos na Constituição Federal e na Lei8.112/90.”
Ademais, o regime de sobreaviso como carga de trabalho só é admitido quando confina o trabalhador à sua residência ou ambiente da empresa, conforme sumulado pelo Tribunal Superior do Trabalho na Súmula n° 428:
Súmula nº 428 do TST
SOBREAVISO (conversão da Orientação Jurisprudencial n.º 49 da SBDI-1)- Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.
Reunião com o Inspetor
Em reunião realizada entre o Inspetor da Alfândega de Itajaí, Analistas-Tributários e representantes do Sindireceita manifestaram descontentamento com o tratamento diferenciado dado às duas categorias da Carreira Auditoria neste episódio, onde a administração daquela unidade segue caminho irregular e discriminatório quando diz resolver problemas administrativos.
Muito embora o Inspetor tenha se declarado isento e justo em seus atos frente aos servidores a ele subordinados, a categoria insistiu no sentimento de indignação e solicitou, então, que se demonstrasse o efetivo cumprimento de serviços por Auditores-Fiscais arrolados nas escalas de sobreaviso, para que se tivesse a visão da efetiva compensação de trabalho por parte daqueles servidores. O pedido foi negado de forma definitiva pelo Inspetor. A precariedade da justificativa apresentada colabora com a percepção de que há a adoção de dois pesos e duas medidas. De fato, a compensação efetiva com o comparecimento ao local de trabalho em muito distingue-se de período de sobreaviso, quando não há conhecimento se, em algum momento, houve o real comparecimento aos recintos da Alfândega.
Entendemos que o sobreaviso é devidamente regulamentado para determinados tipos de atividades (a exemplo das atividades médicas), porém como fica demonstrado claramente na análise legal, para servidores com dedicação exclusiva, ele é encargo a ser tolerado que só se transmudará em efetivo serviço a partir do acionamento do servidor.
Diante disso, o sentimento de não resignação pelo ato discriminatório permanece em nossa categoria. A transparência e o compromisso com a coisa pública impõem demonstrar o efetivo trabalho prestado com o fim de compensar as horas não trabalhadas no recesso de final de ano, o que a administração da Alfândega não se dispõe a fazer, se é que isto é possível.