A Diretoria Executiva Nacional do Sindireceita realizou no dia 24, o primeiro de uma série de eventos e debates virtuais com o objetivo de ampliar a mobilização contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32 de 2020, que foi encaminhada ao Congresso Nacional pelo governo e que tem sido chamada de reforma administrativa. Com esses eventos e debates o Sindireceita pretende fortalecer a mobilização nas redes sociais e também atingir o maior número de pessoas estimulando desta forma a participação da sociedade nas discussões da PEC.
A série de debates virtuais também reforça o trabalho que o Sindicato tem feito em conjunto com as frentes parlamentares e nos diversos fóruns de servidores e que tem por objetivo reforçar a mobilização nas redes sociais e ampliar a luta contra a aprovação da PEC 32. Para o primeiro debate foi convidado o servidor público e jornalista Adroaldo Portal. Por mais de duas horas, os mais de 600 participantes puderam discutir e analisar diversos aspectos e, principalmente, os riscos e prejuízos que a PEC 32 representa para toda a sociedade. Os debates foram coordenados pelo presidente do Sindireceita, Geraldo Seixas e pelo vice-presidente, Ronaldo Godinho.
O presidente do Sindireceita, Geraldo Seixas fez um resgate da atuação do Sindicato desde o início dos debates da PEC 32 no Congresso Nacional e voltou a criticar a proposta e sua discussão em plena pandemia. “Essa PEC é completamente anacrônica. No momento em que o Estado mostra sua importância e que os servidores formam a linha de frente no enfrentamento dos efeitos da pandemia o governo tenta levar adiante essa proposta. Esse descompasso não é do interesse da população que será a maior prejudicada caso a PEC seja aprovada. Como servidores seremos afetados, mas, seguramente, os maiores prejudicados serão aqueles que mais necessitam das políticas e dos serviços públicos que no caso do Brasil são milhões de famílias”, criticou.
Geraldo Seixas ressaltou que a PEC traz como riscos a possibilidade de aparelhamento do Estado e do serviço público. Segundo ele, mudanças em dispositivos constitucionais que asseguram a substituição de servidores concursados por indicados e apadrinhados garante um poder de controle que abre caminho para o aparelhamento e a corrupção. “Se a PEC 32 for aprovada seremos servidores de governo e não mais do Estado. Essa PEC representa um projeto de poder”, reforçou.
Ao falar sobre a importância da mobilização contra a PEC, Geraldo Seixas reforçou que a luta de todos deve ter como objetivo derrotar a proposta e que nesse sentido o trabalho parlamentar nas bases será fundamental. Segundo ele, é preciso aproveitar a capilaridade do Sindicato nos estados e a presença dos delegados sindicais e demais lideranças para promoção de uma série de atos e eventos virtuais e de encontros com os deputados e senados em seus respetivos estados. “Nesse momento é fundamental a pressão das bases sobre os parlamentares. Precisamos reforçar nossa mobilização e ampliar esse trabalho urgentemente. Em Brasília, temos trabalhado juntos as lideranças, com as Frentes Parlamentares e nos diversos fóruns de servidores. É preciso ampliar a luta contra a PEC 32 em todo o país e fortalecer nossa unidade”, acrescentou.
Em sua participação, o vice-presidente do Sindireceita, Ronaldo Godinho destacou que, com esse primeiro evento, o Sindicato dá início a uma série de conversas que tem por objetivo ampliar o debate sobre os efeitos da PEC e levar à sociedade informações para que todos acompanhem e fiquem atentos aos prejuízos que essa proposta pode trazer. “Pretendemos repassar a nossa visão e nossas preocupações sobre o que está sendo proposto. Queremos que todos participem dessa discussão que trata do futuro do estado brasileiro e da própria sociedade”, destacou.
Godinho ressaltou que a PEC foi encaminhada ao Congresso Nacional sem ser debatida e analisada e sem considerar inúmeros aspectos que estão previstos na Constituição Federal de 1988. “São mudanças impactantes que estão sendo propostas sem que se ouça a sociedade e os servidores, e que foram apresentadas fora do tempo certo e no momento em que todos se encontram retraídos e feridos por uma pandemia. Por isso, lançamos esse ciclo de debate com o objetivo de impulsionar essa discussão na sociedade e para mobilizar os servidores públicos”, acrescentou.
O vice-presidente do Sindireceita também defendeu a necessidade de participação e união de esforços na luta contra a PEC 32. Ele chamou a atenção para diversos aspectos negativos da proposta como a falta de definições claras sobre a implementação de vouchers para custeio de serviços públicos para as parcelas mais carentes. Segundo ele, não há no texto da PEC nenhum limite e ou definição de alcance dessa proposta de política pública que pode substituir, por exemplo, a prestação de atendimento à saúde e educação de milhões de famílias. Ele também alertou para o risco que as mudanças no regime de contratação de servidores podem trazer para o financiamento das aposentadorias atuais, principalmente daqueles servidores que recebem pensões e aposentadorias de institutos e fundos. “Sem novos servidores, seguramente o financiamento desse sistema de aposentadorias e pensões ficará comprometido. Com os novos regimes de contratação, somado a terceirização e a privatização de serviços que vão reduzir a contratação de servidores, secam as fontes de manutenção dos institutos de previdência que, em pouco tempo, não terão como se manter e podem quebrar deixando milhões de aposentados e pensionistas desassistidos”, alertou.
Ronaldo Godinho, ao final do debate, agradeceu pela presença do jornalista e servidor Adroaldo e reforçou que é necessário que todos acompanhem as discussões e percebam o quanto o serviço público é importante na vida de cada cidadão. “Se essa estrutura de serviços públicos for fracionada, o Brasil ficará mais abandonado do que já é. Nessa PEC não há nenhuma proposta para melhorar a vida das pessoas. Se a PEC for aprovada a vida de todos vai piorar”, finalizou.
Debate
O servidor público e jornalista Adroaldo Portal iniciou sua fala lembrando que o debate sobre a PEC 32 é urgente porque a reforma tramita no Congresso Nacional justamente num período de crise, quando todos estão voltados para a pandemia de Covid-19. “A reforma administrativa estava na pauta do atual governo desde o início de sua legislatura, havia sempre a ameaça de que seria colocada em votação, como uma espada apontada sobre a cabeça dos servidores públicos, e agora o governo colocou-a em pauta para aproveitar-se do momento e aprová-la antes que a sociedade tome conhecimento dos graves impactos que trará para o país”, afirmou o servidor público.
Adroaldo Portal também destacou pontos da reforma que prejudicam profundamente o serviço público e seus servidores e criticou o texto da PEC que, segundo ele, não entrega nem mesmo o que se propõe, como a versão apresentada pelo governo de modernizar o serviço público e de economia dos serviços públicos. “A verdade é que a PEC 32 tem um objetivo muito evidente, que é o desmonte do estado de bem-estar social e da rede de proteção que a Constituição Federal de 1988 buscou garantir à sociedade. Os servidores públicos e sobretudo a população que depende dos serviços públicos são vítimas desse processo. Os servidores ainda conseguem garantir um pouco de bem-estar social, mas a população ficará ainda mais desamparada, pois essa PEC tem como objetivo permitir que se entregue na mão dos entes privados os interesses da sociedade brasileira, sobretudo dos que mais dependem dos serviços públicos e que são os mais vulneráveis, ” explicou.
O palestrante também esclareceu informações errôneas divulgadas em relação à reforma administrativa, como o discurso de que a PEC 32 só atingirá os futuros servidores públicos. “A PEC 32 atingirá tanto os servidores futuros como atuais, ou até mais os atuais servidores, pois, se a PEC vingar, os futuros servidores exercerão suas atividades num outro modelo, diferente daquele pensado na Constituição Federal de 1988”, esclareceu. Segundo Adroaldo Portal já no início o texto cita regras para ingresso no serviço público que desmontam o atual desenho do serviço público, e garantem, em tese, a estabilidade apenas para carreiras típicas de estado, que o texto sequer diz quais são, e que serão regulamentadas posteriormente. Além disso, em relação às carreiras que não são típicas de estado, haverá uma série de formas de ingresso, nenhuma, porém, com garantia de continuidade.
Adroaldo Portal explicou ainda que, se a PEC for aprovada, o concurso passará a ser somente uma etapa do processo. O candidato que prestar concurso só poderá se considerar servidor público depois que passar por um processo experimental de testes e avaliações que durarão cerca de dois anos. Após essa etapa, será permitido ao gestor escolher entre os aprovados, quais candidatos decidirá manter. Porém, o texto não esclarece quais são as regras de avaliação. Assim, as novas regras de ingresso acabam com os princípios de moralidade e impessoalidade garantidos pela Constituição Federal, pois cada gestor, a nível municipal, estadual e federal poderão fazer suas escolhas.
Perda de cargo
O palestrante também destacou pontos da PEC que interferem nos atuais servidores públicos, como as regras que definirão a perda de cargo. “O processo para decisão da perda de cargo não será mais judicial, e sim, administrativo. Além disso, em relação à avaliação de desempenho, esse condicional proposto na PEC 32, remete para uma Lei Ordinária e não mais uma Lei Complementar. Dessa forma, abre-se uma porta imensa para que os futuros gestores nos três níveis de poder, estabeleçam, em cada uma das suas instâncias, regras diferentes para afastamento e demissão de servidor público, ” esclareceu.
Além da perda de cargo, o atual servidor público também será impactado pela mudança nas regras para cargos comissionados. Hoje, a CF estabelece que em cada categoria de servidores públicos, há um percentual de cargos em comissão que devem ser exercidos por servidores públicos. A PEC 32 acaba com esse limite. Na prática, todos os cargos em comissão poderão ser exercidos por comissionados. E acaba também com as regras que definem que cargos em comissão são aqueles de liderança e assessoramento. Com a mudança, todos os tipos de cargos existentes no serviço público poderão ser ocupados por comissionados. Ou seja, abre-se um precedente para afrouxamento das regras, que poderão resultar em desempenho menor, corrupção e menor autonomia, inclusive, nas carreiras especializadas.
Adroaldo Portal concluiu citando outros ataques não menos nefastos que a PEC 32 trará aos servidores públicos, como o fim da licença prêmio; a vedação de progressão e promoção apenas com base no tempo serviço - a progressão na carreira ser apenas por mérito e avaliação de suas chefias; não haverá mais incorporação de funções, nem mesmo nas estatais; a redução de jornada estará diretamente vinculada à redução de salários, diferente do que diz hoje a CF sobre a irredutibilidade de salários, assim, caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF) interpretar os dois textos e aplicar a lei. “Haverá ainda uma série de medidas que levarão a uma imensa redução de direitos na atuação dos servidores públicos, por isso, entendo que a curto prazo, a PEC traz muito mais prejuízos aos atuais ocupantes de cargos públicos, porque a intenção é enfraquecer sobretudo a atuação das carreiras típicas de estado, e destruir as demais carreiras. Na prática, o que se pretende buscar em relação as carreiras não típicas de estado é uma espécie de “oscipização” do serviço público, como já vemos ocorrer nos serviços da Saúde em todo país, com aquela nefasta lei que criou as OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), ao permitir que se faça o mesmo na educação e segurança pública, e não haverá vedação constitucional,” finalizou Adroaldo Portal.