Técnicos vão intensificar a luta pela unificação
Tramitação em regime de urgência pode trazer novos problemas para a aprovação da Super-Receita
A intenção de acelerar o processo de tramitação do PL 6.272/2005, que cria a Receita Federal do Brasil, pode ser mais um erro do governo. A avaliação é do presidente do Sindicato Nacional dos Técnicos da Receita Federal (Sindireceita), Paulo Antenor de Oliveira. Após a derrota no Congresso Nacional que rejeitou a MP 258, o governo tenta agora aprovar a fusão do fisco por meio de projeto de lei, mas Paulo Antenor destaca que não basta apenas mudar o instrumento, é preciso mudar a forma de discussão da matéria. "Defendemos desde o início que a criação da Super-Receita fosse discutida em PL, mas o que vemos, mais uma vez, é o governo tentando empurrar um projeto formatado para que seja apenas referendado. Se for essa a intenção, existe um risco real de rejeição da matéria novamente", diz.
Paulo Antenor critica inclusive a manutenção do texto do PL, que é basicamente o mesmo texto da MP 258 que foi rejeitado. A proposta incorpora quase todas as emendas aprovadas na Câmara. A principal exceção foi a retirada do dispositivo que permitia aos estados parcelar em até 240 meses suas dívidas previdenciárias. "Alguns defendem inclusive a manutenção do mesmo relator, como se já não tivesse ficado claro o bastante que, como está, essa proposta não passa", acrescenta.
O PL 6.272/05 vai tramitar em Comissão Especial
Na prática, com essa decisão, o governo pretende ganhar tempo e acelerar ao máximo os debates no primeiro semestre de 2006. O Presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, reviu despacho de distribuição anterior ao PL 6.272/2005 para incluir a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania como competente quanto ao mérito. Rebelo também determinou a constituição de Comissão Especial, a ser integrada pelas Comissões de Trabalho, de Seguridade Social e Família, de Finanças e Tributação (que analisará também o mérito). O projeto de lei será analisado pelas comissões, antes de ser enviado ao Senado, mas terá que ser votado também pelo Plenário da Câmara.
O Presidente da Câmara, Aldo Rebelo, determinou que a tramitação do PL se dê em regime de urgência
O PL que cria a Receita Federal do Brasil receberá toda a atenção do governo e da base aliada em 2006. A proposta foi incluída entre as que terão prioridade de votação e vai tramitar em regime de urgência. Pela complexidade do assunto, no entanto, ainda não é certa a aprovação nesse prazo.
Para se ter uma idéia do tamanho da dificuldade, o PL 6.272 altera parcialmente sete normas jurídicas, entre elas a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Além disso, deputados e senadores cogitam incluir no texto um novo programa de parcelamento de dívidas tributárias, uma espécie de Refis 3, que encontra resistência no governo federal.
Diante das dificuldades para a aprovação da matéria, Paulo Antenor ressalta que a categoria vai intensificar o trabalho e a presença na Câmara dos Deputados em 2006. O próximo ano ainda tem como agravante o fato de ser um ano de eleições gerais. Por conta disso, o Sindireceita, desde já, afirma o presidente, está definindo e discutindo com as lideranças a melhor forma de atuação. Paulo Antenor adianta que o trabalho parlamentar será focado no convencimento para as emendas de interesse da categoria. A principal batalha, afirma ele, continua sendo a unificação dos cargos que integram a carreira de Auditoria Fiscal. "Vamos nos concentrar nessa emenda, mas existem outras de interesse. 2006 também será um ano de lutar por recomposição das perdas salariais", adianta. Paulo Antenor ressalta que as ações desempenhadas ao longo de 2005 serão complementadas em 2006. "Realizamos um grande trabalho de convencimento e agora vamos ampliar nossa atuação. Nossa estratégia é lutar pelo reconhecimento e principalmente pela valorização de nossa carreira", conclui.
Deputado Vicentinho conversa com Técnicos que realizaram trabalho parlamentar
Rejeição
A Medida Provisória 258/05, que criava a Super-Receita, perdeu a validade sem que o texto fosse analisado pelo Senado. Sem acordo para votação, a MP foi enterrada e impôs uma nova derrota ao governo. "A medida caiu, é lamentável. A crise política é a responsável por isso", disse o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Após a derrota do governo, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, declarou que a rejeição da Medida Provisória 258/05 representa uma frustração para o País. Na avaliação do parlamentar, uma matéria do interesse da sociedade deixou de ser votada devido a ambições partidárias, em uma situação de exacerbação das disputas políticas.
Embora se recuse a julgar o comportamento da oposição na votação da MP, Aldo disse que os oposicionistas não deveriam impedir o governo de implementar suas políticas. "A democracia suporta a disputa, mas não suporta que os interesses da Nação sejam sacrificados". Ele disse que, em um país democrático como o Brasil, o governo deve ter legitimidade para governar e a oposição, para fiscalizar.
O deputado admitiu ainda que o atual modelo de tramitação das medidas provisórias é falho. "Todos conhecemos essas dificuldades. De qualquer forma, cabe aos deputados e senadores procurar cumprir o papel deles de votar as matérias em pauta."
A rejeição da MP 258 foi decretada em sessão do Senado realizada no dia 18 de novembro. Nem mesmo inúmeras tentativas de negociação e acordos com a oposição, que não concordou com as propostas apresentadas pelo governo, que pretendia manter a estrutura unificada de arrecadação de tributos federais e contribuições previdenciárias, conseguiu salvar a proposta.
E o governo poderá enfrentar novas dificuldades para aprovar o PL 6.272/05 no Senado, onde tem minoria. A proposta de tramitação em regime de urgência que prevê apreciação de 45 dias na Câmara e mais 45 dias no Senado, pode complicar ainda mais essa situação. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT), defende a proposta e acredita que ela será aprovada. "É constitucional, é regimental e tem amparo legal", defende.
Mas, do lado da oposição as reações podem ser ainda mais fortes, especialmente porque 2006 é um ano de eleições e a Super-Receita está entre as propostas prioritárias do Governo Lula, e foi lançada justamente no momento em que o Governo pretendia fazer o chamado "choque de gestão". As primeiras reações vieram do senador do PFL José Agripino (RN). "Em plenário rejeitamos a medida provisória e depois vamos aprovar o texto. Isso não faz sentido", disse.
O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), também reagiu à proposta ser analisada em caráter de urgência, mas concordou em dar um "sentido de urgência". "Vamos trabalhar na matéria, mas sem permitir que tranque a pauta 45 dias após seu envio", disse.
A oposição também criticou a falta de tempo para analisar o projeto. "O PFL não vai continuar convivendo com um processo de tramitação das MPs como o que está acontecendo", afirmou Agripino. Ele destacou que, como os senadores têm pouco tempo para analisar, correm o risco de "engolir gato por lebre".
O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), frisou que as medidas provisórias chegam sem que os senadores tenham tempo para discuti-las.
Vida curta
Foram apenas 120 dias. Esse foi o tempo que durou a Receita Federal do Brasil. No dia 18 de novembro, a Medida Provisória 258 que unificou a fiscalização e a arrecadação previdenciária e fiscal na Receita Federal do Brasil expirou sem conseguir ser votada no Plenário do Senado. O presidente Renan Calheiros encerrou a sessão deliberativa às 12h58 por falta de quorum. Apenas 33 senadores registraram presença, faltando oito para iniciar a ordem do dia com a votação da MP 258. Segundo o presidente do Senado, a MP ficou refém do clima político.
Na última hora, o Presidente do Senado Renan Calheiros convocou uma reunião de líderes, mas nemassim foi possível votar a MP 258
Já o vice-líder do governo, senador Romero Jucá (PMDB-RR), que poderá ser relator do PL 6272/05 no Senado, disse que no dia da votação o ambiente estava nervoso e agitado. "Era uma conjuntura muito adversa", avaliou o vice-líder do governo.
Na última hora, foi convocada uma reunião de líderes para tentar reverter o quadro que já apontava para mais uma derrota, o que acabou se confirmando. Em meio a críticas sobre o excesso de MPs e o rito que subtrai prazo do Senado para discuti-las, pesou o clima político desfavorável na Casa em que o governo não detém maioria. A Super-Receita emperrou na obstrução comandada pelo senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). Depois disso, os líderes do PFL e do PSDB o acompanharam.
Segundo o senador Fernando Bezerra (PTB-RN), líder do governo no Congresso, a oposição não aceitou sequer transformar a MP em projeto de lei com urgência constitucional, que teria de ser enviado pelo Executivo porque a matéria é de competência privativa do presidente da República. Só que, nesse caso, o projeto – com prazo de tramitação de 45 dias em cada Casa e dez dias adicionais para votar somente as mudanças feitas pelos senadores – começaria a tramitar pela Câmara.
Os oposicionistas chegaram a sugerir um projeto de lei com urgência requerida por acordo de líderes. Mas Jucá avisou que a Constituição, no seu artigo 61, impede essa alternativa pelo teor da MP, que trata da criação e extinção de órgãos da administração pública. Outra alternativa seria emendar algum projeto de lei de conversão tramitando no Senado, do modo como foi feito com a chamada MP do Bem (MP 255/05). Só que para isso, segundo Jucá, precisava haver um clima político favorável ao entendimento. "O sentimento agora é que o Senado não aprova mais nenhuma MP, enquanto não mudar o rito", lamentou Bezerra. Renan anunciou que deixou de existir o acordo para dois dias de discussão das MPs e considerou "obstruídos" os canais de entendimento entre os líderes.
Embora o cenário seja adverso, o governo não jogou a toalha. Prudente, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) não arrisca prognósticos, mas quer discutir com os oposicionistas o mérito da proposta. Ele disse que os líderes mostraram que não há divergência em relação à criação da Super-Receita, mas sim sobre a maneira como foi feita.
Os números que o líder do governo apresentou no Plenário revelam que houve aumento de 15,5% na arrecadação nominal de agosto a outubro deste ano – enquanto vigorou a Receita Federal do Brasil –, comparados ao mesmo período de 2004. Mercadante também fez questão de lembrar que o governo Lula editou 4,9 MPs por mês, enquanto no de Fernando Henrique Cardoso essa média mensal foi de 6,8 MPs.