Cristovam Buarque parte para a luta pelo "Educação Já"
Iniciativa ganha as ruas e prega a universalização e a federalização do ensino no Brasil
O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) tem sua história política ligada diretamente às lutas pela melhoria da educação no País. Ex-ministro da Educação, no primeiro mandato do governo Lula, o senador, que acaba de assumir a presidência da Comissão de Educação do Senado, também é o principal articulador de uma campanha nacional que tem por objetivo colocar a educação no centro de todas as discussões sobre o desenvolvimento e o futuro do Brasil. A campanha "Educação Já" tem por missão levar para as ruas do País uma mobilização geral em favor da ampliação dos gastos com o sistema educacional brasileiro, mas, principalmente, conferir à Educação o status de prioridade nacional, assim como ocorreu em campanhas como a da redemocratização.
O momento também é oportuno para o senador, que presidirá a Comissão de Educação do Senado no biênio 2007-2008. O ex-ministro da Educação e ex-reitor da Universidade de Brasília defende uma mudança radical no País, que ainda insiste em deixar de lado a educação. O senador defende que o País só eliminará o atraso e a desigualdade se os partidos políticos e a sociedade se unirem para fazer a revolução do ensino. Cristovam destaca que não é por meio da economia que o País conseguirá dar a todos e a cada um igualdade de oportunidades. Um debate que Buarque terá a oportunidade de conduzir dentro da comissão.
Nesta entrevista, concedida para a revista Tributus, Cristovam Buarque fala de sua proposta e destaca que não falta dinheiro para a execução do projeto de criação de um sistema nacional de educação. Segundo ele, para que essa mudança ocorra é preciso federalizar a educação no País que hoje está a cargo de estados e municípios.
TRIBUTU$ - O que motivou o senhor a criar essa mobilização e o lançamento do movimento "Educação Já"?
Cristovam Buarque - Os governos tratam a educação como um problema, não como uma solução. Todos eles atendem àquilo que se sentem obrigados a atender. Não vêem a educação como vetor das transformações. Todos vêem a economia como sendo o instrumento do progresso. Até hoje, nenhum governo disse: "O instrumento do progresso, aquilo que vai dar o salto, é a educação".
E a educação não será prioridade dos políticos se o povo não demonstrar que é prioridade para eles. Por isso, a população deve ir às ruas para pedir mais atenção à educação. Além disso, todas as mudanças que ocorreram no Brasil começaram com o povo nas ruas. "Diretas Já", "Constituinte Já", "Impeachment Já". Agora, creio eu, está na hora do "Educação Já".
TRIBUTU$ - O senhor afirma que a divisão do ensino fundamental municipalizado e médio sob gestão dos estados "impedem a qualidade". Na avaliação do senhor, qual é a melhor forma de gestão da educação para o País e qual a proposta defendida pelo senhor nessa campanha de mobilização?
Cristovam Buarque - É necessário promover a federalização da educação. Quer dizer, a responsabilidade pela educação de base neste País, pelas crianças brasileiras, deve ser do governo federal, como são as universidades, como são os aeroportos, as agências do Banco do Brasil. É preciso haver metas claras para todas as 164 mil escolas deste País. Que elas tenham horário integral, professores com piso salarial satisfatório, professores contratados por meio de concurso federal e não apenas municipal. Essa é a melhor forma de educação e é a que defendo na campanha.
TRIBUTU$ - Como funcionaria o sistema único de educação e qual deve ser o papel dos Estados e Municípios dentro dessa nova perspectiva?
Cristovam Buarque - A educação ficaria a cargo da União, mas o controle seria descentralizado e a cargo dos estados e dos municípios. O Governo dirá: "A minha prioridade é a educação. O legado que vou deixar ao meu País é um País caminhando para uma educação de qualidade, horário integral em todas as escolas, professores muito bem remunerados, para que sejam bem preparados e bem dedicados". E como fazer isso? Federalizando a educação. Investindo na escola nacional, criando um Ministério da Educação de Base, senão não vai conseguir, porque deixando junto o ensino superior e a educação de base, só quem vai se beneficiar é o ensino superior, que tem mais força.
Na federalização dizer: "Nós vamos fazer com que todas as escolas tenham horário integral". Do mesmo jeito que se fez anos atrás: "Nós vamos construir a represa de Itaipu". Levou 12 anos, mas todos os governos se deram conta, um atrás do outro. Agora, dizer: "Nós vamos implantar o horário integral, com o setor bem remunerado, bem dedicado, bem preparado, escolas bonitas e com equipamentos. Isso levará 15 anos e, para isso, vai se precisar de um grande acordo nacional com a oposição, porque um governo pode começar e outro terminar. Então, tem de haver um acordo de tal maneira que os governos continuem, uns depois dos outros. Como a Constituição, os deveres continuam, como a bandeira, o hino nacional, como Itaipu, como a construção de Brasília. Coisas que continuem de um governo ao outro. Se não se fizer isso, não vai dar o tom.
TRIBUTU$ - Para o senhor, qual é o modelo ideal para o ensino básico, médio e universitário? Há recursos para implementação de um programa dessa natureza?
Cristovam Buarque - O atual problema é que o Governo só tem olhos para o ensino superior. Por que se dá tanta prioridade à universidade? Porque os professores e estudantes universitários têm capacidade de mobilização, de pressão. Em um País em que se dá muito valor ao diploma superior, a universidade em si já é um ganho imediato para as pessoas. Ao passo que investimento em educação básica só traz resultado prático num cenário de pelo menos dez anos.
Além disso, investimento em ensino superior só atende os 18% dos jovens que terminam o ensino médio. E os outros 82%? O Governo se concentra muito em aumentar o número de vagas no ensino superior, em vez de aumentar o número de jovens que precisam terminar o ensino médio. Eles já deveriam terminar o ensino médio sabendo algum tipo de ofício. Nós precisamos incluir quem está na exclusão. Faculdade é para quem já saiu da exclusão e quer dar um passo adiante.
Para tanto, precisamos de cerca de R$ 2 mil ao ano por aluno, para que o Brasil faça com suas crianças o mesmo que fez a Coréia. Como são 48 milhões de alunos, arredondando, precisamos de R$ 100 bilhões de orçamento. Mas, aí, volto a insistir: não é uma questão apenas de dinheiro. Por exemplo, se o Governo decidir comprar computadores para as escolas, muitos não serão instalados porque a edificação ou a rede elétrica não permitem, ou porque o professor não sabe usar.
TRIBUTU$ - Quais são as metas propostas e os resultados previstos, caso haja essa "revolução" no ensino brasileiro?
Cristovam Buarque - De uma maneira simples, eu poderia dizer que a meta é que a escola dos filhos das favelas e do campo seja equivalente e tenha a mesma qualidade da escola dos filhos dos condomínios. Isso significa federalizar a educação com a gerência descentralizada: horário integral, professores com piso salarial satisfatório e contratados por meio de concurso federal e um padrão mínimo de edificação, de equipamentos e de conteúdo. Também temos de ter uma Lei de Responsabilidade Educacional e temos de ter metas. Criamos a idéia de que basta investir mais na educação, criando-se a vinculação orçamentária, mas não se definiram metas. Isso não adianta. O que faz a escola ser melhor não é mais dinheiro, mas o dinheiro necessário para cumprir certas metas. Em quantos anos todas as escolas serão em horário integral? Em quantos anos vamos abolir o analfabetismo? Em quantos anos todas as crianças estarão terminando a 4ª e a 8ª séries e o ensino médio? É isso que eu chamo de federalização da educação básica. Isso não se faz em pouco tempo. Leva 15, 20 anos.
TRIBUTU$ - Há espaço político para essa mobilização? Como as pessoas podem participar?
Cristovam Buarque - Claro que há. O ideal seria que houvesse motivação por parte do núcleo central do poder. Que eles dissessem e agissem compromissados com a educação. Já que não é o caso, é dever da sociedade civil exigir de nós, parlamentares, e do Governo que as escolas dos filhos das favelas e do campo sejam equivalentes e tenham a mesma qualidade das escolas dos filhos dos condomínios. Escolas de alta qualidade. Para mim, na hora que fizer isso, o resto eles fazem. Veja bem: o que diz o pai de família? "Eu vou dar educação ao meu filho e o resto ele faz". Qual um chefe de Estado: "Eu vou dar educação ao meu povo, o resto o meu povo faz".
Para participar, basta incorporar-se às nossas caminhadas nas cidades onde estamos lançando o movimento pelo Brasil. Já passamos por Fortaleza (CE), Redenção (PA), Curitiba (PR), Serra (ES) e Vila Velha (ES). Breve divulgaremos um calendário com as datas dos futuros eventos. Você também pode mandar uma mensagem para Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. e conversar com os coordenadores do movimento. Quando formos caminhar na sua cidade, você pode se juntar aos organizadores, convidar amigos, distribuir propaganda, enfim. Entre em contato e descubra o que é mais prático, fácil e prazeroso para você fazer.
TRIBUTU$ - Qual a contribuição que uma categoria como a dos Analistas- Tributários da Receita Federal e o Sindireceita podem oferecer a esse processo?
Cristovam Buarque - A divulgação do movimento "Educação Já" é o mais importante agora. O espaço dado pela revista, que circula entre os Analistas-Tributários no Brasil inteiro é uma grande contribuição. Assim, os servidores da Receita Federal, independentemente de partido político, de crença, do gênero, da raça poderão ter ciência do movimento e comentarem com os colegas na pausa do café, falar com os amigos em um bar, conversar em casa, nas ruas e, se quiserem, participar das mobilizações nas cidades. $