O problema é que a relação entre a dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB) não para de subir. E vai crescer mais ainda nos próximos anos. Uma razão para isso é a incapacidade do governo de cortar gastos públicos. Outra é a recessão, que faz a arrecadação diminuir, ampliando o rombo das contas públicas, e prejudica a própria base de cálculo. Mesmo que a dívida ficasse estacionada - está longe de ser o caso -, se tornaria proporcionalmente maior em relação a um PIB cada vez menor.
"O país precisaria de um esforço fiscal muito maior do que o atual, que resultasse em superavits primários de pelo menos 2% do PIB", afirmou Rotagno. Era essa a expectativa do governo para os próximos anos. Mas, diante do insucesso que tem enfrentado na aprovação das propostas enviadas ao Congresso Nacional, a previsão de superavit foi revisada, no mês passado, para 0,7% em 2016 e 1,3% em 2017.
Só em 2018, o Ministério da Fazenda espera voltar ao patamar que mirava anteriormente. Mas ninguém acredita que essas novas metas serão factíveis. Rostagno prevê resultado fiscal negativo de 0,3% do PIB neste ano. Mesmo no próximo, haverá deficit - de 0,1%, de acordo com o economista.
Sem separar dinheiro para pagar ao menos os juros, é inevitável que a dívida cresça. E, com o PIB cadente, ficará cada vez mais assustadora. "As agências que não rebaixaram ainda o país provavelmente não se deram conta dessa tendência. Quando perceberem, a perda do grau de investimento do Brasil será inevitável", apostou o economista do Mizuho.
Para Rostagno, nos últimos meses do próximo ano, a proporção da dívida ultrapassará a barreira de 70% do PIB, um patamar assustador para um país emergente. Encerrará 2016 em 71%. No ano seguinte, serão 73%. E em 2018, 74%.Quando Dilma Rousseff assumiu a Presidência em 2011, essa relação era de 53,4%.
Sem a anuência de duas agências ao menos, fundos de investimentos mais conservadores passam a ser proibidos de comprar papéis do governo brasileiro. O acesso a um mercado de US$ 15 trilhões fica reduzido a US$ 5 trilhões. Com menor mercado para seus títulos, o governo terá de pagar juros mais altos. Mas o prejuízo vai muito além, porque as empresas brasileiras também passarão a ter restrições de crédito. Devem investir menos, empurrando a economia para baixo.
A relação entre dívida e PIB, um dos nove critérios usados pelas agências de classificação de risco, está entre os mais relevantes, e é suficiente para tirar o grau de investimento do país por qualquer das agências de classificação.
As reservas internacionais de US$ 370,5 bilhões, ainda que sejam elevadas, não tornam a situação muito confortável. "Elas apenas indicam que o Brasil não entrará em uma situação de insolvência", diz Rostagno. Na prática, as agências devem levar isso em conta para não rebaixar ainda mais o país, deixando nos níveis mais elevados do grau especulativo.
CaloteHá países desenvolvidos com dívidas bem maiores do que a nossa, mas, como nunca deram calote, isso não é visto como um problema. Para países emergentes, a expectativa é de uma dívida menor. "Existe uma espécie de consenso de que é tolerável a dívida bruta corresponder a até 60% do PIB para o país ter grau de investimento. Estamos numa trajetória ascendente preocupante", afirmou o economista José Matias-Pereira, professor da Universidade de Brasília (UnB). Os países emergentes como um todo vêm conseguindo diminuir sua dívida em relação ao PIB, diferentemente do Brasil, que aliás é recordista nesse grupo quanto ao tamanho de seus débitos.
Para o economista Mansueto Almeida, especialista em finanças públicas, a trajetória de perda de credibilidade do país está longe de terminar enquanto não forem feitas reformas estruturais para controlar os gastos do governo federal. Para Mansueto, o freio na queda do Brasil ladeira abaixo ainda é a presença de Joaquim Levy no cargo de ministro da Fazenda.
Ele ao menos tem feito esforços para cortar gastos, que seguiriam intocados se isso dependesse de outros integrantes da equipe ministerial com grande ascendência sobre decisões fiscais. "Mas estamos ainda longe do ajuste que nos leve a um superavit primário de 1% ou 2% do PIB", acrescentou.