Agência Senado - 03/10/2017
O Plenário do Senado decidiu, na noite desta terça-feira (3), marcar para o próximo dia 17 a análise da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de afastar do mandato o senador Aécio Neves (PSDB-MG). Pela decisão da Primeira Turma do STF (OFS 70/2017), o senador também deve se recolher em sua residência durante a noite. Foram 50 votos favoráveis ao adiamento e 21 contrários.
Na abertura da ordem do dia, o presidente do Senado, Eunício Oliveira, informou que foram apresentados quatro requerimentos para adiar a votação do ofício. Um dos requerimentos, da senadora Lídice da Mata (PSB-BA), pedia que a matéria fosse submetida à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), antes de ser apreciada em Plenário.
O senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) apresentou um requerimento para marcar a decisão para o próximo dia 17. Outros dois requerimentos — um assinado pelos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e José Pimentel (PT-CE) e outro pelo senador Lindbergh Farias (PT-RJ) — também pediam o adiamento da votação para o dia 17 de outubro. O argumento era que o STF marcou, para o próximo dia 11, um julgamento que pode definir se o Senado tem competência legal para rever a decisão sobre Aécio.
O presidente Eunício não recebeu o requerimento apresentado por Lídice da Mata. Ele disse que o regime de urgência impede que a matéria seja enviada a uma comissão. Eunício apontou, porém, que o adiamento seria possível — desde que deliberado pelo Plenário. Assim, Eunício decidiu pela votação do requerimento do senador Valadares e considerou os outros requerimentos como apoio ao principal. Ele ainda decidiu pela votação nominal registrada no painel.
— [Com a decisão do Plenário] Estaremos dando ao STF a oportunidade de revisar a decisão de uma de suas turmas — declarou o presidente, destacando a importância da harmonia e da independência entre os poderes.
Radicalização
De acordo com Valadares, o Senado deveria fugir da radicalização. Ele disse que seu requerimento é uma forma de evitar o confronto do Senado com o STF. Valadares destacou que a marcação de uma sessão para o dia 11 é uma atitude de respeito do Supremo com o Senado. Para Valadares, o adiamento da votação sobre o ofício também mostraria o respeito do Senado com o STF. Lídice da Mata disse que o país tem vivido um aprofundamento da crise política e econômica e o Senado não deveria estimular o confronto entre dois Poderes da República.
— Adiar a decisão significa construir uma ponte para a saída da crise com o STF — argumentou a senadora, que fez questão de se definir como defensora da Constituição.
"Navegabilidade"
O senador Jader Barbalho (PMDB-PA) classificou como “absurdo” o posicionamento da 1ª turma do STF e destacou que os senadores são legitimados pela vontade popular. Na visão de Jader Barbalho, a decisão do STF é contrária aos preceitos constitucionais.
— Devemos respeito ao STF, mas devemos respeito acima de tudo à Constituição — afirmou.
O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) argumentou que o Regimento Interno do Senado (art. 279) impediria o adiamento de matérias em regime de urgência. Na opinião de Renan, se o Plenário se submetesse ao adiamento, seria “melhor fechar o Senado e entregar a chave para o STF”. Ele acrescentou que o Brasil precisa de um “pacto de navegabilidade”, com todos os poderes se respeitando.
— O que estamos fazendo aqui é defender a Constituição. Transferir essa votação significa, em outras palavras, dissolver o Senado — disse Renan.
O senador Paulo Bauer (PSDB-SC) afirmou que sua defesa do mandato de Aécio vai "além da cor partidária e alcança a defesa da Constituição". Bauer disse que os requerimentos apresentados nem deveriam ser votados, já que não haveria previsão regimental para esse recurso. O senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) também negou em seu discurso “qualquer nuance partidária ou regional” e defendeu a legitimidade do Senado para analisar a medida cautelar do STF.
— Não há previsão constitucional para o afastamento. E se houvesse, deveria ser submetida ao Senado — argumentou Anastasia.
"Abismo institucional"
Por outro lado, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) destacou que o respeito à Constituição significa cumprir decisão judicial. Para o senador, não cabe ao Senado relaxar decisões judiciais cautelares diferentes da prisão. O desrespeito a uma decisão do STF, acrescentou Randolfe, poderia levar o Senado para o “abismo institucional”.
O senador Cristovam Buarque (PPS-DF) e a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) manifestaram apoio aos requerimentos. Cristovam lembrou que há igualdade entre os Poderes da República, mas cada um tem o seu papel. Ele afirmou que não cabe ao Senado interpretar as leis, mas sim ao Supremo. Kátia disse que um suposto desrespeito ao STF seria como uma "morte da democracia". O senador João Capiberibe (PSB-AP) pediu cautela ao Senado, ao defender o adiamento da votação.
Eduardo Cunha
Lindbergh Farias afirmou que o senador Aécio Neves é, na verdade, um dos responsáveis pela crise do país. O senador lembrou que Aécio, derrotado nas eleições presidenciais de 2014, questionou o resultado das urnas, fez aliança com o deputado Eduardo Cunha — também afastado pelo Supremo e posteriormente preso pela Lava Jato — e apoiou o impeachment da ex-presidente Dilma. Lindbergh cobrou coerência dos senadores da base do governo Temer e criticou decisões da Justiça no âmbito da operação Lava Jato. Apesar das críticas, Lindbergh Farias disse que não apelaria para a "revanche". Ele apontou, porém, que o Senado corre o risco de tomar uma decisão contrária à que o STF vai decidir no próximo dia 11. Assim, seria mais prudente o adiamento da discussão sobre o afastamento de Aécio.
Na mesma linha, o senador Otto Alencar (PSD-BA) disse que o momento exige “prudência” e também pediu que o Senado espere a decisão do STF no dia 11. O senador Alvaro Dias (Pode-PR) apontou que os argumentos em favor do adiamento são convincentes. Na visão de Alvaro Dias, o povo brasileiro tem como prioridade a “limpeza” das ações de corrupção. Ele acrescentou que as autoridades judiciárias precisam ser respeitadas e valorizadas.
O senador Humberto Costa (PT-PE) destacou a importância da independência entre os Poderes. Ele disse entender que não é adequada a decisão do Supremo de afastar um senador, sem a aprovação do Senado. No entanto, Humberto Costa registrou que o Senado não pode aprofundar a crise institucional e manifestou apoio aos requerimentos de adiamento.
— O adiamento é uma proposta adequada, que em nada nos diminui diante do Supremo — declarou Humberto Costa.
"Bom senso e cautela"
O senador Jorge Viana (PT-AC) também defendeu o adiamento e o bom senso de ouvir o pleno do Supremo. Gleisi Hoffmann (PT-PR) disse apoiar a investigação de Aécio, mas criticou a decisão da turma do STF de afastá-lo.
O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) sugeriu à Mesa desconhecer os requerimentos de adiamento para o dia 17, por uma questão regimental, mas defendeu o adiamento da discussão para o dia 11 — mesmo dia da reunião do STF. Ele lembrou que decisão foi apenas “de uma turma, de apenas três ministros contra dois” e que o “bom senso” pedia o adiamento da discussão. Caiado disse que o Senado nunca se pautou pelo desrespeito à Constituição e destacou a importância da independência dos Poderes.
Votação imediata
O senador Lasier Martins (PSD-RS) ressaltou que o arquivamento do processo contra Aécio Neves no Conselho de Ética foi um erro. Lasier, que foi um dos quatro parlamentares a votarem contra o arquivamento, pediu a votação imediata do ofício do STF.
E o senador Roberto Requião (PMDB-PR) criticou a vitaliciedade dos ministros do Supremo e a “hermenêutica criativa” do Judiciário. Para ele, o adiamento da votação “não se justifica”. Ele também negou a existência de um "clima de desastre". A seu ver, "risco institucional é uma conversa mole".
— Nós votamos e por isso existimos — afirmou Requião.
Consultoria
O presidente do Senado, Eunício Oliveira, registrou que, a pedido da Mesa, a Consultoria e a Advocacia do Senado prepararam pareceres que podem embasar a decisão dos senadores. Para o advogado Hugo Souto Kalil, o mandato parlamentar jamais pode ser suspenso por ato unilateral do Judiciário, sem a participação da respectiva Casa legislativa.
Hugo Kalil destaca ainda que não existe previsão legal de medida cautelar de afastamento ou suspensão de mandato parlamentar. O advogado afirmou que a imposição de medida cautelar a pessoa não sujeita a prisão preventiva representaria uma violação legal. Segundo Kalil, o motivo dessa deliberação não é a pessoa do senador ou sua liberdade pessoal, mas sim a preservação da atividade parlamentar e do mandato parlamentar, que foi outorgado pelas urnas. Na opinião do advogado, a medida cautelar contra senador pode ser classificada como inconstitucional.
"Se uma medida cautelar, mesmo que não chegue a ser uma prisão, pode influir na qualidade ou no desempenho do mandato parlamentar, é natural e até um consectário lógico do texto constitucional que a Casa legislativa se pronuncie sobre a situação", argumenta Kalil.