Outra característica do sistema tributário brasileiro destacada pelo procurador foi a profunda injustiça fiscal
O advogado e procurador da Fazenda Nacional, Aldemário Araújo Castro, também defendeu uma maior transparência da Administração Tributária durante o Ciclo de Debates.
Para Adelmário, a política tributária do Brasil nas últimas décadas é uma política construída fundamentalmente com base na legislação e em instrumentos legislativos e há um considerável desprezo à Administração Tributária e aos seus servidores. “As duas marcas mais significativas da política tributária que está em curso são a excessiva complexidade e a profunda injustiça fiscal. Nos últimos 30, 40 anos, observamos uma nítida preferência por legislar, por elaborar normas, em detrimento à utilização da Administração Tributária no espaço da tributação. Há quase que um culto à norma”, destacou.
Ainda na avaliação do procurador da Fazenda Nacional, não se pode pura e simplesmente crucificar o governo como responsável pela política tributária que está em curso. Ele afirmou, no entanto, que a impressão que se tem é que, nas últimas décadas, os governos fizeram um acordo tácito com certos setores da Administração Tributária Federal para não se envolver com as políticas nessa área. “Vocês continuam garantindo a arrecadação tributária nos níveis que vem ocorrendo, de preferência com acréscimos, e não vamos querer saber como isso é feito”, alertou sobre a sua percepção de como o governo vem conduzindo a política tributária.
A crítica que deve ser feita aos governos, na visão de Aldemário, deve ser outra. “Por que é que se deixou ou se deixa que certos setores formulem a política tributária da forma como está sendo formulada? Essa política em curso cria uma complexidade excessiva do Sistema Tributário Brasileiro”, disse.
O procurador da Fazenda também observou, durante sua exposição, que está prevista, na Constituição Federal, a competência do Senado Federal para acompanhar o desempenho das administrações tributárias, o que atualmente não acontece. “Não há no Senado Federal nenhuma iniciativa para se criar qualquer espaço de discussão da Administração Tributária e do seu desempenho. Só se consegue identificar discussões pontuais de projetos de lei que tratam de matérias tributárias. Uma comissão ou subcomissão, uma discussão permanente sobre administração tributária e sua eficiência não existem. Essa discussão não está na ordem do dia”, disse. De acordo com Aldemário Araújo, a implantação do controle social sobre a gestão tributária não excluiria a importância do Senado Federal no desempenho desse papel.
Outro ponto abordado pelo procurador da Fazenda e criticado com veemência foi a criação dos parcelamentos especiais, os chamados “Refis”. “Não se tem ideia do transtorno, do desserviço que essas coisas produzem para a administração. Isso virou uma confusão legislativa de tal natureza que os sistemas de informática da Receita Federal e da Procuradoria da Fazenda Nacional passam anos para conseguir ser ajustados para poder lidar com esse tipo de parcelamento. Além disso, a consolidação desses débitos demora de dois a seis anos”, criticou.
Coordenador do MST destaca a importância da mobilização da sociedade para a resolução de graves problemas do País
Stedile afirmou que o ITR sempre esteve distante dos fundamentos que levaram à sua inserção na Constituição Federal
O economista e coordenador Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, João Pedro Stedile, também concordou que os movimentos sociais e as forças organizadas da sociedade brasileira precisam ter controle sobre a política tributária e sua execução. “As formas de fazê-lo são muitas e me alegra que o Sindicato esteja tão empenhado em fazer as gestões políticas necessárias para termos esse mecanismo de controle social, ainda que relativo”, afirmou.
Stedile citou os diversos problemas e absurdos na área tributária que preocupam os movimentos sociais. Ele lembrou que o Imposto Territorial Rural (ITR) vem, progressivamente, perdendo o seu sentido. “O ITR não serve para nada, não tem nada a ver com espírito de sua criação, que vem do Estatuto da Terra. Ele deveria contribuir para que a propriedade rural cumpra a sua função social e hoje seu valor é menos que o IPVA. Nesse país há uma classe capitalista dominante que transformou o Estado em propriedade privada”.
Stedile também criticou a isenção de ICMS das exportações de matérias-primas, por meio da Lei Kandir. “O Estado Brasileiro admite que os exportadores e latifundiários apropriem-se parte da renda coletiva. E eles nunca ganharam tanto dinheiro como agora. Aqui no Rio Grande do Sul exportamos 8 milhões de toneladas de soja”, informou.
O economista destacou também que é preciso urgente revisar a isenção de impostos sobre a produção de agrotóxicos no país. “Produzir veneno nesse país não gera nenhum recolhimento de IPI, PIS e COFINS. Isso foi um acordo entre secretários da fazenda de todo o Brasil reunidos com o secretário da Receita Federal. É um problema grave de saúde pública. Estamos chegando a uma geração de câncer de mama em meninas de 12 e 13 anos”, alertou.
Por último, Stedile ressaltou que as soluções para estes e outros problemas do país passam, necessariamente, pela mobilização da sociedade. “Nós, como representantes de movimentos sociais, temos que fazer todos os esforços e bater em todas as portas. Esse país está carente de um projeto de que se discuta para onde a sociedade brasileira vai. Os governos viraram gerentes do capital. Podem até fechar as contas e gerar mais empregos, mas não mudam as condições estruturais da sociedade. E isso depende de um grande processo de mobilização da sociedade”.