COAEF/SUARA aponta para o fracasso do mapeamento de processos de trabalho

COAEF/SUARA aponta para o fracasso do mapeamento de processos de trabalho

Já há alguns anos, a Receita Federal do Brasil (RFB) adota como ferramenta de gestão o gerenciamento de processos de negócio. Até esse ano, no entanto, o trabalho conduzido pela Coordenação-Geral de Planejamento, Organização e Avaliação Institucional (COPAV) e executado pelas diversas áreas técnicas da RFB, ainda não havia decolado. Poucos processos estavam modelados, a maioria deles de forma incompleta e imprecisa.


Mas a tramitação da MP 660/14, com emendas acatadas na Comissão Especial do Congresso Nacional que alteravam atribuições dos cargos da Carreira de Auditoria da RFB, retiradas posteriormente na votação em plenário a pedido do Ministro da Fazenda e por assumir compromisso em solucionar a questão de forma interna corporis, teve como efeito provocar ou permitir uma decisão mais firme da Receita Federal no sentido de disciplinar, efetivamente, estas atribuições. Para tanto, a administração central apontou para o mapeamento de processos – até então incipiente - como solução dessa definição, o que parece bastante razoável, desde que esse mapeamento se dê com o rigor e a isenção inerentes a uma boa ferramenta gerencial.


Desde então, a evolução no mapeamento de processos de trabalho da RFB indica que o propósito da administração era firme, o que nos implica a responsabilidade de compreender, criticar e interferir no processo. Caso contrário, os Analistas-Tributários podem perder uma oportunidade histórica de reconhecimento e evolução, algo que perseguimos há muito tempo.


Entretanto, ao pautarmos a solução para a questão das atribuições e à medida em que a RFB ofereceu o mapeamento dos processos de trabalho como instrumento de resolução desse problema, estabelecendo um calendário exíguo para sua conclusão, marcamos uma ruptura no fluxo normal do mapeamento. É necessário que compreendamos que, originalmente, o mapeamento não tinha o propósito de tratar e dar solução no âmbito específico das atribuições da Carreira de Auditoria. Seu objetivo, muito antes disso, era permitir à organização conhecer seus processos de trabalho, dimensioná-los e aprimorá-los, com vistas ao estudo de lotação ideal, à reorganização estrutural e à parametrização do trabalho.


Devemos também entender melhor o Gerenciamento de Processo de Trabalho ou BPM (Business Process Management). O termo “mapeamento”, na verdade, refere-se apenas à primeira fase do gerenciamento, em que são identificados e organizados em cadeia os processos de trabalho. A fase atual do BPM da Receita é a imediatamente posterior ao mapeamento, de modelagem dos processos. Nesta etapa o fluxo de cada processo de trabalho é desenhado e descrito, através de diagramas e registros detalhados de cada uma das atividades ou tarefas, com indicação dos responsáveis.


Num processo normal, após a fotografia oferecida pela modelagem, haveria uma próxima etapa, de aprimoramento, onde os processos redundantes e desnecessários seriam eliminados, os imperfeitos aprimorados e outros, necessários, acrescentados. E esse é o objetivo maior: melhorar a organização. Por fim, restaria a gestão desses processos, o acompanhamento sistemático desse aprimoramento e a permanente avaliação e correção.


Contudo, não há tempo para avançarmos em todas as etapas do BPM, e fomos nós que provocamos esse calendário. E se, por um lado, isso demonstra certo compromisso da administração, de outro nos coloca em situação de risco, uma vez que a pretendida solução para as atribuições não se dará como evolução, fruto do aprimoramento dos processos, mas como esclarecimento, fruto da fotografia do marco atual. Ainda assim, face à omissão histórica da Administração, à pressão corporativista contra a plena atuação dos Analistas-Tributários e ao lixo normativo infralegal que se acumula em função disso na RFB, esse esclarecimento, se correto, será bem-vindo.


Mas quando falamos de “correção” na condução do processo, nos reportamos às premissas estabelecidas com muita propriedade pela COPAV. A principal delas, talvez esteja no documento “Mapa de Atribuições”. Estão ali os parâmetros para análise das atribuições em cada processo de trabalho. Assim, portanto, é a lei que rege cada cargo e o seu universo de atribuições, e não qualquer norma específica que serve de parâmetro para a análise.


Quando nos propusemos a participar do processo de modo institucional, deixamos claro à administração que não estávamos brincando. E não vamos brincar com o futuro de trinta mil servidores e da Administração Tributária Federal. Mesmo que não haja nenhum motivo para confiarmos em processos conduzidos pela administração - basta recordarmos os episódios relativamente recentes do Pro-Pessoas e da LOF - resolvemos apostar uma última ficha. Será que erramos?


Num processo conduzido pelas Unidades Centrais, em que todos os coordenadores, com apenas uma única exceção, são Auditores-Fiscais, já desconfiávamos que encontraríamos resistência aos nossos argumentos. O que não imaginávamos é que encontraríamos quem ameaçasse a própria Carreira de Auditoria.


A videoconferência, promovida pela COAEF/SUARA (Coordenação de Atendimento e Educação Fiscal) nesta semana para tratar do mapeamento, deixou os colegas do atendimento perplexos, seja por constatarem o pouco conhecimento e envolvimento da Coordenação com o mapeamento, tarefa prioritária da RFB nesse momento, seja pela visão turva sobre a Administração Tributária Federal e sua Carreira específica (CARFB).


No evento, conduzido pelo coordenador-substituto Antonio Henrique Lindenberg Baltazar, ficou evidente o afastamento da Coordenação da realidade do atendimento e do processo de discussão do mapeamento de processos.


Desde o início de nossa análise, da qual participam ativamente chefes de CAC/ARF e servidores das DIVIC, muitos dos quais também dedicados ao mapeamento da RFB, referências em sua área de atuação, ficou evidente a necessidade de diferenciação entre o atendimento de orientação sobre legislação tributária: analítico, específico da administração tributária, com exigência de conclusividade e diretamente ligado ao macroprocesso do crédito tributário; do atendimento geral: expresso, inespecífico, para o qual se admite parametrização do tempo de atendimento, de caráter protocolar, cadastral ou de mera formalização.


A partir dessa diferenciação quanto à complexidade do atendimento, de acordo com a lotação atual de servidores e vinculados com as atribuições legais de cada um dos cargos presentes no atendimento, também é claro para nosso Grupo de Trabalho que deve haver alguns níveis de corte na análise de atribuições.


O primeiro refere-se às competências e atividades que são específicas da administração tributária, atividades que a Constituição Federal (art. 37, XXII) determina que seja feita por servidores de carreira específica. Estas atividades podem ser aglutinadas como “orientação sobre legislação tributária e aduaneira”, atividade completamente distinta da orientação geral sobre meios, formas e prazos de cumprimento da obrigação tributária principal ou acessória, de natureza burocrática.


Orientar sobre a legislação tributária e aduaneira brasileira não é tarefa simples, não admite imprecisão – sob risco de prejuízo ao contribuinte ou propriamente ao fisco, nem pode ser parametrizada ou submetida a ritos expressos. Outrora, essa atividade já se chamou conta-corrente, depois atendimento analítico, e tem mesma natureza do plantão fiscal. Só quem teve a oportunidade de atender grande empresa com cinco páginas de impedimentos fiscais ou prefeitura com centenas de milhões de reais em débitos que remontam trinta anos, com um infindável histórico de parcelamentos, reparcelamentos, compensações e remissões, sabe a complexidade dessa atividade.


Ainda devemos estabelecer outro corte dentro do rol de atividades específicas: a orientação do sujeito passivo no tocante à interpretação da legislação tributária, atividade privativa do cargo de Auditor-Fiscal, estabelecida pela alínea e, inc. I, art. 6º da lei 10.593/02, tratado via processo de consulta através de rito especial (Decreto 70.235/72, Lei 9.430/96, Decreto 7.574/11 e IN RFB 1.396/13).


Reservadas à Carreira de Auditoria da RFB as atividades específicas da Administração Tributária, de orientação sobre legislação tributária e aduaneira e orientação sobre interpretação da legislação tributária, todas as demais atividades de atendimento podem e devem ser exercidas pelos servidores administrativos em exercício na RFB. Cabe, no entanto, um último corte, entre atividades que exigem acesso aos sistemas e analise sumária, que não podem ser exercidas por servidores cedidos e funcionários do Serpro, por exemplo, e outras protocolares e de atualização cadastral, sem qualquer restrição.


É evidente que a diferenciação entre a atuação de um servidor da Carreira de Auditoria e demais servidores não pode se limitar ao Redarf e ao ajuste de GPS. O lixo normativo que permite tal interpretação é o objeto primeiro do mapeamento: afastar tudo que não seja legal, racional, efetivo e moral. Qual administrador pode lidar com um clima organizacional onde funcionários que recebem três, seis, doze ou vinte mil reais fazem a mesma coisa? Isso não é legal, moral e nem ético. Quais administradores se disporão a responder pessoalmente pelos processos de desvio de função?


A COAEF/SUARA parece desconsiderar tudo isso. Da referida videoconferência colhemos seu entendimento sobre o tema:


- “A Constituição é vaga, temos que nos ater à legislação ordinária”.


- “Na legislação, o único serviço exclusivo da Carreira é a retificação de DARF/GPS”


- “Permitir a orientação tributária apenas para a Carreira traria o caos no atendimento”.


Não pretendemos afastar outros servidores do atendimento, pelo contrário, julgamos que a atuação de Assistentes-Técnicos Administrativos, Técnicos e Analistas Seguro Social, entre outros, é importante e essencial. Todos esses servidores são profissionais competentes e devem ser aproveitados na plenitude de seu potencial. Entretanto, como qualquer outro servidor, ficam limitados ao alcance de suas atribuições legais. Do contrário, teremos que admitir como legítimo que os Analistas-Tributários compartilhem com os Auditores-Fiscais o lançamento de ofício, por exemplo.


O caos, em nosso entender, surge da falta de definição correta das atribuições de cada cargo, do acúmulo de lixo normativo infralegal, do esvaziamento da Carreira de Auditoria, da aceitação do processo de fragilização das relações de trabalho que assola o mundo. Devemos nos lembrar, como ilustração válida nesse caso, que o cargo de Assistente-Técnico Administrativo foi criado por uma exigência externa de substituição de terceirizados que realizavam tarefas de triagem nas Unidades da RFB. Sua função original é de suporte administrativo. Mas o poder executivo sempre faz seus contorcionismos para remunerar pior o servidor, exigir mais trabalho e oferecer um serviço de pior qualidade ao cidadão. Vamos compactuar com essa lógica? Não é caótica a rotatividade dos ATAs, que não se fixam na RFB em vista de sua baixa remuneração – compatível com a função original do cargo, mas insuficiente para o que se pretende exigir ilegalmente em contrapartida?


Resistir à precarização do serviço público, reagir aos abusos contra os servidores, construir uma instituição que respeita seus colaboradores e persegue a excelência no cumprimento de sua missão são ações que deveriam nos unir nesse processo de reconstrução da Receita Federal do Brasil. Nossa indignação extrapola questões corporativistas, expressa a decepção com a falta de compromisso e compreensão sobre um processo fundamental, ao qual nos dedicamos num último esforço de convergência.


A distância entre o discurso do secretário da Receita Federal do Brasil, secretário-adjunto e subsecretários e a atitude da COAEF/SUARA nos faz descrer da efetividade do mapeamento de processos. Também nos causa estranheza que a contenção orçamentária tenha impedido a realização das oficinas de mapeamento das áreas de atendimento, cadastro, tecnologia da informação e programação e logística. Afinal, não sabemos mais quais são as prioridades da Casa, qual é a validade do discurso da administração.


Se for preciso, nos afastaremos do mapeamento para não corroborá-lo desvirtuado. Será a última decepção, a certeza que a solução que buscamos nunca virá intramuros. Se precisarmos, em última instância, abandonar o atendimento, também o faremos: a situação dos Analistas-Tributários é limítrofe e não permitiremos que se desvirtue a natureza do cargo.


Lamentavelmente, voltamos à estaca zero. Por enquanto, a única certeza é a disposição geral e irrevogável da categoria para a luta.