O presente estudo técnico, elaborado por juristas especialistas em Direito da Seguridade Social, tem por objetivo subsidiar os trabalhos da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados acerca da constitucionalidade da Proposta de Emenda à Constituição 06/2019, a chamada “reforma da Previdência”. Veja o Estudo.
Os institutos signatários consideram imperiosa uma reforma no modelo previdenciário brasileiro, haja vista as nuances que atualmente denotam possível futuro desequilíbrio financeiro, orçamentário, social e atuarial.
Ajustar as regras previdenciárias, no entanto, requer máxima paciência, imparcialidade e justiça, esta última adquirida pelo estudo das reais necessidades de mudança, com objetivo de conferir segurança jurídica à reforma e evitar consequências danosas para o País.
Conclusões
Sob as inspirações deste estudo técnico, a qual dispõe meramente sobre o prisma constitucional, conclui-se que a proposta de reforma da Previdência, enviada pela PEC 06/2019, poderá importar em retrocesso social e incongruência com a própria normatização legal e constitucional pátria, com o contrato social estabelecido pela Constituição Federal de 1988, implantando na sociedade legítima insegurança jurídica.
Os efeitos dessa proposta já são sentidos pelos segurados da Previdência Social, os quais encontram-se em alvoroçada ansiedade, preocupados com seu futuro e o de sua família, temendo que seus direitos sociais sejam tolhidos.
Toda essa insegurança culmina em desconfiança ao próprio sistema de proteção social – no qual se inclui a Previdência, retirando-lhe a necessária seriedade e garantia de amparo, além de afastá-lo do sistema ao invés de atrai-lo. Ademais, acaba por ocasionar o esvaziamento do regime, reduzindo receitas importantes para manutenção do sistema. Esse efeito social tem importante impacto no Estado Democrático de Direito em que vivemos, o qual é fundado na Ordem Social como primado maior da evolução econômica.
Sem ordem social não há evolução econômica
A PEC 06/2019 poderá acarretar muitas consequências, tais como a diminuição das receitas, aumento das despesas – inclusive com judicialização – desmoralização do sistema previdenciário público e, o pior, a desconfiança legítima de seus segurados, desmantelando o Estado de proteção social atualmente vigente.
Em suma, pretende a PEC 06/2019 não só alterar o sistema previdenciário, mas a essência federativa do Estado. Por estes e outros motivos que os nobres parlamentares que compõem a CCJC possuem a árdua tarefa de equilibrar as reais necessidades da reforma com os anseios sociais. Do contrário, fomentarão, de forma definitiva, a (des)confiança legítima do cidadão no Estado, efeito catastrófico e nunca aplicado por qualquer nação próspera.
Possivelmente estamos na contramão da evolução jurídica, social e econômica do mundo para embarcar numa aventura cujo destino já é conhecido: a falência social e moral do Estado. Isso se justifica pela ausência completa de elementos que comprovem ser a proposta o ideal para o País, garantindo efeitos positivos a longo prazo e ampla redistribuição de renda. Erros do imediatismo já cansamos de cometer. É hora de pensar a longo prazo e garantir estabilidade à nação.
Não há novidades na proposta remetida pelo Governo Federal, em especial por que os erros do passado não foram consertados nesta proposta. Do contrário, abrem-se as portas para que a especulação econômica tenha mais espaço de ganho em detrimento da confiança, acarretando a inevitável segregação de recursos nas mãos de poucos, o que vai de encontro com a publicidade da proposta, de igualar pobres e ricos como objetivo principal. E não é só isso.
Só conseguirão investir verdadeiramente no novo regime capitalizado aqueles que possuem recursos de sobra, ou seja, a menor parte da sociedade.
A aventura econômica só possui espaço e segurança na sobra de recursos que garantam o básico na vida com bem-estar. Sobrando, arrisca-se. Sem sobra, não haverá proteção. Nesta lógica, a quem se destina a PEC 06/2019? A tornar ricos mais ricos (pois lhes sobra) e pobres cada vez mais pobres (pois não lhes sobra)? Afinal, que tentativa de igualar é está no qual o comparativo está abaixo da desproteção?
Não há estudos, nem comparativos viáveis, que ratifiquem a teoria do isolacionismo protetivo social. A lógica biológica e filosófica da proteção humana é fundada no conceito de ser social, onde a comunidade é a pedra-base do crescimento e da evolução. Desproteger sem ainda ter o básico garantido só dá ao cidadão o legítimo direito de desconfiar. É daí que advém o conceito de desconfiança legítima, a caixa de pandora social que libertará todos os males sociais e destruirá o resquício de comunidade que temos.
Portanto, esta nota conjunta retrata a preocupação dos especialistas em Seguridade Social, fundados no conhecimento in loco das necessidades sociais e não somente econômicas. A reforma poderá, e deverá ser feita no âmbito constitucional e infraconstitucional sem necessariamente alterar a essência federativa do Brasil, fundada na fraternidade, na solidariedade e na Ordem Social, tendo como base o primado do trabalho, para se alcançar bem-estar e justiça social.
É extremamente arriscada a desconstitucionalização neste momento, enquanto não se verificar plena confiança legítima, pelo que esta nota conjunta entende pela rejeição integral da proposta, opinando pela criação de equipe multidisciplinar e técnica para elaborar a proposta adequada ao modelo social real do Brasil.